Por Simão Pessoa
O primeiro time de futebol fundado na Cachoeirinha foi o Madureira Atlético Clube, vulgo MAC, surgido no início dos anos 40, na Rua General Glicério, na casa nº 75, de Luiz Gonzaga, que foi também seu primeiro presidente.
Nos anos seguintes, o MAC se transformaria no melhor time suburbano da cidade, tendo em sua melhor formação vários craques que depois se tornariam profissionais consagrados: Ney, Sabá Baima, Sabazinho, Barbeirinho e Lupércio; Reginaldo e Regildo; Caiado, Luiz Oneti, Paulo Oneti e Alexandre.
Apesar dos títulos conquistados, o MAC nunca teve uma sede social definitiva e desapareceu em 1965, quando seu presidente era João Franco (aka “Bolaça”). Na época, o clube possuía uma sede provisória no início da Rua Borba.
Apesar de surgido em maio de 1939, o Orion Football Clube, fundado por Antônio Altino da Silva (aka “Mestre Ceará”), só começou a participar de partidas oficiais em 1942, transformando-se no grande saco de pancadas do MAC.
Sua sede provisória era na Rua Ajuricaba nº 1.140, mas depois se mudou para a Rua Borba nº 170, quando ganhou a denominação de Orion Esporte Clube, em razão de participar de várias modalidades esportivas.
O clube chegou a ter uma sede própria na Rua Borba, mas acabou sendo extinto em 1965, quando seu presidente era Henrique Alves. A sede própria continua de pé até hoje.
O Ypiranga Futebol Clube foi fundado no dia 5 de setembro de 1942, pelos irmãos Horácio e Osvaldo Nascimento, João Gomes, Nilo Pereira de Souza, Waldemar Alves de Lima, Waldemar Lisboa, Celso Potoqueiro e José Lázaro. A sua sede continua até hoje no cruzamento das ruas Carvalho Leal e Barcelos, em terreno doado pela prefeitura.
O Ypiranga foi o time da Cachoeirinha mais bem-sucedido no campeonato da segunda divisão, tendo conquistado vários títulos. Seu primeiro campo de futebol foi encampado pela prefeitura e no local foi erguido o Palácio Rodoviário.
O Santos Futebol Clube foi fundado no dia 1º de maio de 1952 por Jorge Lima, Artur Silva, Jorge Cordeiro, Hugo, Pretinho, Gestê e Sabá. Foi o único time da Cachoeirinha que disputou o campeonato da primeira divisão, uma classe especial do futebol amador, uma vez que ainda não existia a categoria profissional. Ele conquistou o título máximo de 1958, vencendo o Guanabara Esporte Clube por 3 a 1.
Nessa partida, o time do Santos era formado por Ney, Raimundinho, Silvino, Paulo e Roberto; Melo e Tucupi; Gestê, Pretinho, Pinguim e Cacheado. Como não possuía sede, o Santos utilizava a sede provisória do MAC, na Rua Borba.
O Botafogo Futebol Clube foi fundado em 1955, na Rua Carvalho Leal, por Valdemar Torres, Miguel Sena, Antenor Noia, Paulo Biribá, Esteves e Boanerges. Alguns anos depois, eles adquiriram um terreno na Rua J. Carlos Antony, entre a Carvalho Leal e a Waupés, onde construíram sua sede social.
Apesar de participar intensamente do esporte amador, o Botafogo tinha seu foco voltado para as promoções sociais. Alguns dos melhores bailes de carnavais do bairro eram realizados em sua sede. Nos anos 70, os sócios venderam a sede do clube e ele deixou de existir.
O Expressinho Futebol Clube foi fundado em 1962 pelo onipresente índio piratapuia Marajara e se tornou o primeiro clube de peladeiros do bairro. Entre seus atletas estavam Carlito Bezerra, Beto Folha Seca, Zeca, Laércio, Walter Oliveira (aka “Nego Walter”, primo do Carlito), Leandro, Wando, Flávio Oliveira (aka “Flávio Cupu”, irmão do Nego Walter) e Ariosto (filho da conhecida professora Maria Emília).
As reuniões, à base de lamparina, eram realizadas na casa do Carlito Bezerra, na Rua Borba. Quando as reuniões estavam muito chatas, um dos atletas, “distraidamente”, apagava a lamparina dando um discreto sopro na chama, o que fazia Marajara ir à loucura. Se fosse descoberto, o autor da façanha recebia dez bolos de palmatória e ficava suspenso duas partidas. Marajara era abusado.
O Sancol Futebol Clube foi fundado em janeiro de 1968, na casa do Rui Assunção, e logo se transformou no melhor time de peladeiros do bairro. Tendo no gol o melhor goleiro da Cachoeirinha de todos os tempos (Ademar Arruda, codinome “Gato”, que depois se casou com a Mércia, irmã do Mário Adolfo), os laterais Carlito Bezerra e Flávio Cupu, os zagueiros Celso e Epitacinho, os meio campistas João Bosco, Antídio Weil e Jorge Almeida, e os atacantes Manuel Augusto, Nego Walter e Beto Folha Seca, o Sancol não possuía adversários à altura nas concorridas partidas disputadas nos campos do Penarol, União, SAJ (Sanatório Adriano Jorge) e Vesúvio. A origem do nome estranho se transformou em uma das lendas do bairro.
Conta-se que nas três primeiras partidas o nome oficial do time era Santos Futebol Clube, por tratar-se de uma das paixões do presidente Ruizinho Assunção. Ocorre que o equipamento de quinta categoria do Santos empanava um pouco o brilho dos atletas, que ficavam ressentidos com as gozações dos times adversários.
Não era pra menos. As camisas brancas de listras negras dos atacantes santistas simplesmente abriam a costura embaixo do braço ao primeiro contato físico com os adversários.
Para se livrar do mico, o Sancol desenvolveu um refinado toque de bola, que servia para evitar os esbarrões e agarrões dos jogadores adversários e, em última instância, preservava o único jogo de camisas do clube.
Nas cobranças de escanteio, infelizmente, a tática não surtia efeito. Era comum o Nego Walter, dono de uma fantástica impulsão, subir para cabecear e deixar uma das mangas da camisa na mão de um zagueiro adversário que o estava segurando, tal a baixa qualidade da costura do equipamento.
Louco para jogar no Santos, Rubens Bentes, que não conhece futebol nem de cumprimentar, procurou o candidato a deputado estadual José Belo Ferreira e conseguiu a doação de um equipamento oficial para o Santos Futebol Clube.
Produzido pela famosa camisaria Athleta, o equipamento trazia 20 camisas com gola olímpica, 20 calções, 20 meiões e dois uniformes para goleiros.
Na hora em que o presente foi desempacotado na casa do Ruizinho, o presidente subiu nas tamancas.
– Porra, major, mas o Santos não vai jogar com esse equipamento nem pelo caralho! – reagiu o santista roxo, indignado. – Isso é palhaçada, porra, isso é palhaçada. É como se um time chamado Vasco da Gama fosse jogar com o equipamento do Flamengo ou um time chamado Corinthians fosse jogar com o equipamento do Palmeiras. Pode enfiar esse equipamento no rabo, que o meu time não vai usar essa porcaria, não!
Por incrível que pareça, o equipamento presenteado pelo deputado José Belo Ferreira era uma cópia fiel do equipamento oficial do São Paulo Futebol Clube, com listras verticais nas cores vermelha e preta sobre um fundo branco.
– Peraí, Ruizinho, o deputado nos dá um equipamento de marca e você fica criando caso por causa das cores? Muda o nome do time, porra! – disparou Carlito Bezerra.
– Como essas cores lembram uma cobra coral, vamos chamar o time de Coral! – sugeriu Nego Walter.
– Ou então Coral do Santos, pra gente manter o nome original – apimentou Epitacinho Almeida. – Coral lembra orquestra sinfônica e a gente pode espalhar que escolhemos esse nome porque o nosso time joga por música…
– Já que é pra avacalhar, vamos chamar logo de Sancol, que é uma mistura de Santos e Coral… – atalhou Ademar Arruda.
O invocado nome acabou sendo aprovado por unanimidade.
As confusões não terminaram aí. Para garantir uma vaga de reserva no time, Rubens Bentes recebeu do presidente a preciosa incumbência de lavar e engomar o equipamento após as partidas e entregá-lo limpo nos dias de jogo. Ele cumpriu a tarefa com resignação e estoicismo.
O problema é que Rubens Bentes se equipava todo, mas nunca entrava nas partidas, mesmo que o Sancol estivesse aplicando uma goleada implacável em algum time adversário.
Depois de curtir a sexta partida à beira do campo, sem ser chamado nem pra fazer aquecimento, Rubens resolveu se vingar: vendeu os calções e os meiões. Só não vendeu as camisas porque um coiote deu com a língua nos dentes e entregou a presepada para o Carlito Bezerra, que conseguiu resgatar as camisas do time ainda no quarador da dona Maria, mãe do injuriado quase-jogador.
O aloprado Rubens Bentes passou mais de dois meses sem colocar os pés fora de casa para não ser morto a chutes, pauladas e pontapés pelos furiosos jogadores do Sancol.
AS HISTÓRIAS DA CAXUXA
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