(Por se tratarem de textos longos que só cabem num livro físico, optamos por destrinchar o Capítulo 5 em várias partes, para poder caber nessa plataforma digital. So sorry.)
A tristeza dos fãs com a dissolução da banda Casulo
Formada em maio de 2002, a banda Casulo tinha como proposta musical fazer releituras da vertente mais pop do reggae, apenas por pura diversão e tiração de onda. Não foi o que aconteceu. Composta por Rondinele (bateria), Maca (baixo), Adonai Chacon (guitarra base), Alex Gil (guitarra solo) e Adonay Brasil (vocal), a Casulo começou a se destacar na cena local e receber convites para participação em vários eventos relevantes, como o Manaus Beats (a versão manauara do Skol Beats) e Manaus Reggae Fest I, II e III, tendo se apresentado ao lado de grandes nomes do reggae nacional, como Planta e Raiz, Maskavo, Natiruts e Tribo de Jah, e até do reggae internacional, como banda de abertura do “Peter Tosh Celebration Tour”.
Eles também participaram do Manaus Summer Fest, um evento que reuniu vários estilos musicais, dividindo o mesmo palco com a Banda Eva, de Salvador, tocando “Vamos Fugir”, de Gilberto Gil, e “Three Little Birds”, de Bob Marley. Na sequência, gravaram seu primeiro CD demo, em 2004, intitulado “Casulo”, contendo seis faixas inéditas, um trabalho realizado de forma independente, que contou com a produção musical de Kiko Tupinambá (Planta e Raiz) e foi masterizado por Rodrigo Castanho, no Midas Studio, em São Paulo. No mesmo ano, eles conseguiram emplacar a música “Yara” nas rádios de Manaus, alcançando as primeiras posições.
Em 2005, a Casulo entrou no circuito dos grandes festivais, participando do Madeira Festival, em Porto Velho (RO), do Amazonas Eco Music, em Manaus, em 2005 e 2006, do Ceará Music, em Fortaleza (CE), também em 2005 e 2006, aproveitando o período para realizar várias apresentações na capital cearense, e em 2007, se fizeram presentes no Festival de Verão, de Salvador (BA). Ainda, em 2007, participaram do Prêmio Toddy de Música Independente, realizado em São Paulo, indicados na categoria destaque regional. Além disso, emplacaram uma série retumbante de hits (“Nenhum Dia Deve Ser Igual”, “Além Do Mar”, “Barquinho”, “Bem Na Vida”, “Dai De Fé”, “De Volta Pra Ela”, “Fiel Protetor” e “Flor Serena”), mas inacreditavelmente acionaram o modo “game is over” quando estavam na crista da onda.
Pois é, a banda que dois amigos fãs de reggae decidiram montar no início dos anos 2000, despretensiosamente, com a única intenção de tocar covers de grupos conhecidos animando festas da cidade, acabou se transformando numa das principais referências do reggae do Amazonas. Hoje separados, ex-integrantes relembraram ao jornalista Patrick Marques, do G1 AM, como foi o início do grupo, histórias dos sucessos e os motivos que levaram ao declínio.
Definitivamente, o que os rapazes não esperavam era o sucesso imediato logo após as composições das primeiras músicas autorais. A partir de então, o grupo de amigos passou a ser reconhecido em vários estados do país e por artistas já renomados da cena do reggae nacional. Um dos membros fundadores da banda Casulo, Rondinele Reis, revela como tudo começou. Vizinho de Adonai Chacon, outro membro do grupo, eles moravam em um condomínio de Manaus e costumavam descer para o hall de entrada do edifício para tocarem músicas de reggae em um violão, em 1998.
“Ele tocava violão, eu cantava junto com ele. A gente passava a tarde e a noite toda por lá, tocando músicas de reggae das bandas que a gente gostava. Na época, o Natiruts estava surgindo, tinham lançado o primeiro disco, e a gente estava ouvindo muito Cidade Negra, Bob Marley. A gente tocava sempre e tivemos a ideia de fazer a banda, mas era só mesmo a vontade”, lembrou Rondinele.
Somente no ano de 2002, os jovens decidiram colocar a ideia em prática. Chacon contou que o nome da banda veio de uma das músicas do primeiro disco do grupo, chamada “Casulo”. A banda só tinha um baterista e um guitarrista base: Rondinele e Chacon, que iniciaram a busca por outros integrantes. Rondinele lembrou que foi até uma escola de música e perguntou se alguém teria interesse em participar da banda. “Me indicaram o Maca Costa, que era baixista. Na época, ele tinha 16 anos. Eu liguei e ele topou na hora, meio assustado, não sabia do que se tratava, mas aceitou. Tínhamos o Chacon na guitarra base, eu na bateria e o baixo. Faltava uma guitarra solo. Liguei para um colega de muitos anos que estava parado, o Ido, e ele topou. A banda já estava quase formada, mas ainda faltava o mais difícil de todos que era um cantor”, disse Rondinele.
Uma situação inesperada encerrou a busca pelo vocalista da quase formada banda Casulo. Rondinele Reis reencontrou um amigo de infância, Adonay Brasil, em um ensaio de outra banda de amigos. Surpreso por rever o amigo que havia se mudado para o Acre quando ainda eram crianças, ele pressentiu que o grupo estava finalmente completo. “Ele estava no ensaio, eu cheguei para acompanhar e o reencontrei. No intervalo, ele estava tocando violão e eu vi que ele cantava. Pensei ‘caraca, o cara canta para caramba’. Eu não sabia que ele cantava, fiz o convite, ele topou e entrou. Essa foi a nossa primeira formação”, contou Rondinele. O vocalista Adonay Brasil lembrou que voltou do Acre para Manaus em 1977 para fazer faculdade e fez amigos que jogavam futebol. “Eu cantava e tinha uma banda em Rio Branco, porém, meu estilo era o rock!”, diverte-se.
Completa, a banda Casulo passou a fazer apresentações em casas de show de Manaus, com sucessos de bandas já existentes. Na época, nomes do reggae nacional como Armandinho, Planta e Raiz e Mascavo fizeram turnês na cidade e eles já tiveram oportunidades de abrir os espetáculos. Dois anos depois da formação da Casulo, em 2004, Chacon contou que os integrantes começaram a fazer músicas autorais e lançaram o primeiro álbum, que tem o mesmo nome da banda. “Começamos a compor nossas músicas próprias e fizemos ‘Yara’, ‘Pita’, ‘Meu Lugar’ e ‘Sol e Lua’, os principais hits da Casulo. Assim vem a formação que chamamos de original, que é a de quando lançamos o nosso primeiro CD, com Alex Gil na guitarra solo”, contou Chacon.
Rondinele contou ainda que os integrantes não esperavam o sucesso que fariam. Segundo ele, os membros só queriam tocar reggae e se divertir. “Não tínhamos a dimensão do sucesso que iríamos fazer. A única coisa que eu tinha na cabeça era que estava sendo muito difícil juntar um pessoal para tocar. Eu falava para o Chacon que estava dando tanto trabalho para reunir a galera que tinha certeza que, depois, ensaiaríamos com tanta vontade que seríamos uma banda muito boa”, comentou.
Após o lançamento das músicas autorais e o primeiro álbum da banda Casulo, a repercussão não demorou a acontecer. O baterista Rondinele lembrou que a banda passou a tocar em grandes eventos. Durante as apresentações, ouviam o público cantar as músicas junto com a banda. Com a repercussão do trabalho autoral do grupo, as músicas começaram a tocar nas rádios não só de Manaus, mas de outros estados. “Ver uma galera cantando as músicas que fizemos em casa, aquilo ali era uma sensação maravilhosa. Era uma das melhores sensações. Para mim, era arrepiante”, disse Rondilene.
O vocalista Adonay Brasil conta que outras bandas nacionais faziam questão que a Casulo abrisse os shows quando vinham para Manaus. “Veio o estouro da banda, ficamos em primeiro lugar em várias rádios do Norte e Nordeste. Bandas como O Rappa, Banda Eva, Natiruts, Maskavo, Planta e Raiz, Tribo de Jah, Cidade Negra, Cláudio Zoli, Skank e Armandinho surgiram em nossas vidas. Éramos requisitados por esses medalhões todas as vezes que faziam shows na Amazônia. Fomos praticamente apadrinhados por eles”, contou o vocalista.
Os meninos começaram a ser convidados para tocar também em outros estados do Norte e Nordeste do país, inclusive em festivais de música nacionais como o Ceará Music, em Fortaleza, e no Festival de Verão de Salvador. “Nos dois anos que participamos do Ceará Music, a gente tocou nos palcos principais, depois de O Rappa, depois de Lulu Santos. Era uma coisa muito grande. Mas, no Festival de Verão, tinha uma coisa especial. Apesar de não ter sido no palco principal, era um palco alternativo que era importante para a cena musical daqueles anos. Quem tocava eram bandas que estavam em ascensão no cenário nacional”, contou Chacon.
Com o passar dos anos, o vocalista Adonay Brasil contou que diferentes situações e divergências entre os integrantes fizeram com que a Casulo tivesse várias pausas durante a carreira. “No começo é mais fácil de administrar, depois, os anos vão passando e o que era diversão vira rotina. A rotina te desgasta. Ficamos muito conhecidos, quase ficamos famosos de verdade, igual bandas grandes. Enquanto uns integrantes queriam experimentar outros elementos no som da banda, outros não queriam, e aí ficou difícil. E também eu tenho uma parcela grande de culpa da banda ter desandado”, lembrou Brasil.
O vocalista lembrou que teve problemas com drogas que influenciaram no relacionamento com os outros integrantes, além dos problemas individuais vivenciados por cada membro. ”Na época, eu estava com problemas sérios com drogas. Achava que que fumar maconha e cheirar cocaína me energizavam para aguentar a rotina de trabalho. E aí, na verdade, eu fiquei destemperado e pavio curto demais. E o resto da banda também tinham seus problemas, mas cabe a eles falar. Sendo que as drogas atrapalharam, somando com a imaturidade do grupo, com ego e orgulho de cada um, foram ingredientes inevitáveis pra banda dar um tempo”, comentou.
Segundo Chacon, ele chegou a assumir os vocais da banda nas interrupções após saídas de Adonay Brasil, para cumprimento de contratos que já estavam firmados. “As interrupções sempre foram muito mais pela saída dele, mas eram compreensíveis porque a família dele é de Rio Branco. Ele sempre morou lá. O tempo que ele ficou aqui era por causa da Casulo. Houve momentos que ele teve de retornar por questões familiares. Mas não só isso. Os outros integrantes também começaram a ter projetos paralelos, nós temos nossas profissões. Isso fez com que tivéssemos interrupções”, disse Chacon. Atualmente, Chacon trabalha como psicólogo, Rondinele é designer, Alex Gil é professor de Jiu-Jitsu, além de publicitário, e Adonay Brasil trabalha como músico com projetos solos e uma banda em Rio Branco.
Na última vez que a banda Casulo paralisou as atividades, em 2017, Chacon, Brasil e Alex Gil montaram uma nova banda, chamada Boreaw. Os integrantes fizeram shows na cidade entre 2018 e 2020, mas as atividades tiveram que ser interrompidas pela pandemia do novo coronavírus. Sobre um possível retorno da banda Casulo no futuro, os integrantes comentaram não saber ao certo, mas, no momento, não há nenhuma previsão de volta. “Eu acho que, se no futuro bater a saudade, com certeza vai rolar, apesar de tudo ter um ciclo, um começo, meio e fim. Não sei se tá no começo, no meio. Ninguém sabe. Por enquanto ela está parada e sem previsão nenhuma de volta. Cada um foi para seu rumo, fazer suas coisas. Quem sabe se no futuro, se todo mundo sentir saudade, ver que tem necessidade de retornar, voltamos mais uma vez. Mas, por enquanto, não. Continuamos amigos e isso é o que importa”, finalizou Rondinele.