É claro que nem tudo é paz, amor, harmonia e positividade na cena reggae manauara. O gênero musical ainda enfrenta muitas desvantagens na cidade, na medida em que as rádios comerciais estão inteiramente dominadas pelo estilo sertanejo, essa baboseira musical intragável que está levando a MPB para o fundo do poço.
A mídia tradicional também não esconde um mal disfarçado preconceito de que reggae é sinônimo de “ganja” e faz pouco caso sobre os bailes de reggae que rolam na periferia de Manaus. Se não bastasse isso, o sucesso do sertanejo está ligado umbilicalmente ao mercado fonográfico e às estratégias de marketing e divulgação dos artistas e gravadoras bancados pelo “Agro é Pop”, que têm investido cada vez mais na produção e promoção desse gênero jerico e roceiro. Uma tragédia anunciada!
De qualquer forma, ainda há uma pequena luz no fim do túnel para a galera do reggae, do rock e do hip hop, enfim, da cena musical independente, porque hoje não se pode falar de música sem considerar a força das plataformas de streaming, como o Spotify e o YouTube. O streaming é o futuro da música porque, além de ajudar bastante a divulgar novos compositores, também barateia os custos de produção, divulgação e comercialização.
Antigamente, as pessoas baixavam música por meio do mp3, o que atrapalhava muito o faturamento dos artistas. Hoje em dia, o consumidor tem música acessível, mas paga um preço justo. Como monetizar dignamente isso a favor dos músicos é a pergunta de 1 milhão de dólares. Nesse aspecto, o caso do compositor e cantor Ivan Lins é emblemático.
Com o anúncio da reprise da novela “História de Mim”, da TV Globo, voltou a circular uma entrevista dada pelo músico, responsável pelo tema de abertura do folhetim, “Lembra de Mim”, que marcou a época. Com mais de 600 músicas gravadas e 10 indicações ao Grammy, Ivan Lins é uma quase unanimidade no meio musical brasileiro.
Basta lembrar que, um belo dia, o músico recebeu uma ligação internacional de Miles Davis dizendo que havia selecionado 28 músicas dele para um álbum duplo. A lenda do trompete ainda reclamou que o disco ia dar muito trabalho “porque seus arranjos, man, têm muitas notas…”
Em abril de 2024, Ivan Lins falou sobre dificuldades que vinha sofrendo, tanto financeiras como emocionais, e destacou como os serviços de streaming afetaram sua carreira. “Eu voltei para a terapia, para curar outra depressão, porque eu perdi minha aposentadoria. Não posso mais parar, diminuir o trabalho, agora eu tenho que trabalhar mais do que nunca, porque minha única fonte de renda agora é o palco, show. Se eu parar, eu não tenho como tirar de outro lugar, porque o direito autoral é muito baixo para eu manter a vida que construí através do meu trabalho”, contou o compositor, em entrevista ao jornalista Marcelo Tas, no programa “Provoca”, da TV Cultura.
Ivan Lins também fez uma reflexão sobre o impacto do streaming na carreira dos músicos, principalmente quanto aos rendimentos. “Se fosse na época dos CDs, com 900 mil ouvintes mensais (dados dos seguidores do cantor no Spotify), eu poderia vender pelo menos umas 80 mil cópias de CDs e sobreviver com isso, sendo remunerado justamente. Agora, não tem mais CD. Ninguém compra mais”, completou. “Para ganhar R$ 1 de um canal de streaming, a música precisar ser ouvida 20 mil vezes. É um completo absurdo!”
A história do streaming de música começa com a era dos downloads digitais. No final dos anos 90 e início dos 2000, serviços como Napster, que permitiam o compartilhamento de arquivos de música, mudaram a indústria musical para sempre. Embora Napster tenha enfrentado batalhas legais que resultaram em seu fechamento, ele abriu caminho para a ideia de acesso digital à música.
O verdadeiro marco inicial das plataformas de streaming, no entanto, veio com o lançamento do Pandora em 2000, um serviço de rádio online que usava algoritmos para recomendar músicas. Em 2005, o YouTube foi lançado, permitindo que usuários carregassem e assistissem a vídeos, incluindo videoclipes. No entanto, o grande avanço veio em 2008, quando o Spotify foi fundado na Suécia. O Spotify introduziu um modelo de negócios baseado em assinaturas e publicidade, permitindo aos usuários acessar uma vasta biblioteca de músicas sob demanda.
As plataformas de streaming transformaram radicalmente os hábitos de consumo de música. Antigamente, os consumidores compravam álbuns físicos ou faixas digitais individualmente. Com o streaming, a música se tornou mais acessível do que nunca. Por uma taxa mensal fixa, os usuários podem acessar milhões de músicas, criando uma biblioteca pessoal que pode ser transmitida em qualquer dispositivo com conexão à internet.
Esse modelo de negócios democratizou o acesso à música, permitindo que os ouvintes descobrissem novos artistas e gêneros com facilidade. Playlists acuradas e algoritmos de recomendação personalizaram a experiência de audição, adaptando-se aos gostos individuais dos usuários. Como resultado, o consumo de música tornou-se mais diversificado, com ouvintes explorando uma gama mais ampla de músicas do que nunca.
Embora o streaming tenha democratizado o acesso à música, seu impacto nos músicos é complexo. Por um lado, as plataformas de streaming oferecem uma visibilidade sem precedentes para artistas emergentes. Qualquer pessoa pode carregar sua música em plataformas como Spotify, Apple Music e YouTube, alcançando um público global sem a necessidade de um contrato com uma grande gravadora.
No entanto, a monetização através do streaming é um desafio. Os pagamentos por streaming são relativamente baixos, com artistas recebendo uma fração de centavo por reprodução. Isso significa que, para ganhar uma renda substancial, os músicos precisam acumular milhões de streams. Para muitos artistas independentes, ganhar a vida exclusivamente com streaming é difícil.
Além disso, a indústria musical passou a depender mais de outras fontes de renda, como shows ao vivo, venda de merchandising e patrocínios. O streaming pode servir como uma ferramenta de marketing poderosa, ajudando a aumentar a base de fãs e impulsionando as vendas de ingressos e produtos, mas raramente é a principal fonte de renda direta.
O modelo de negócios da indústria musical também sofreu mudanças significativas devido ao streaming. As gravadoras, que antes dependiam das vendas de álbuns físicos, tiveram que se adaptar ao ambiente digital. Muitos selos agora se concentram em estratégias de distribuição digital e marketing online para promover seus artistas.
Se não bastasse isso, o streaming reduziu a necessidade de produção física de mídias, como CDs e vinis, embora ainda haja um mercado para colecionadores. As gravadoras investem cada vez mais em contratos de 360 graus, que permitem que elas obtenham uma parte da receita de todas as fontes de renda de um artista, incluindo streaming, shows, merchandising e patrocínios.
O futuro do streaming de música promete ser emocionante, com várias tendências emergentes que podem moldar a indústria nos próximos anos. Algumas dessas tendências incluem:
Inteligência Artificial e Algoritmos de Recomendação: Os algoritmos de recomendação continuarão a melhorar, proporcionando descobertas musicais ainda mais personalizadas e precisas.
Experiências Interativas: Plataformas como o Spotify estão explorando novas formas de interação com os ouvintes, incluindo playlists colaborativas, podcasts exclusivos e vídeos musicais.
Qualidade de Áudio: Serviços de streaming de alta definição, como Tidal e Amazon Music HD, estão ganhando popularidade, oferecendo áudio de qualidade superior para audiências exigentes.
Realidade Virtual e Aumentada: Com o avanço da tecnologia de realidade virtual e aumentada, os shows virtuais e experiências imersivas de música podem se tornar uma norma.
Monetização para Artistas: Espera-se que novas plataformas e modelos de negócios surjam para oferecer melhores opções de monetização para artistas independentes.
Enquanto oferece oportunidades sem precedentes para a descoberta de música e visibilidade de artistas, também apresenta desafios significativos em termos de monetização e sustentabilidade para os músicos. À medida que a tecnologia continua a evoluir, o futuro do streaming promete trazer ainda mais inovações que moldarão a paisagem musical global.
A chave para o sucesso na era do streaming será a capacidade de adaptação e inovação contínua, tanto para artistas quanto para profissionais da indústria musical.