Por Simão Pessoa
Em fevereiro de 2006, Alzimar Santiago e Rubenilson Massulo, os homens da linha de frente do GRES Jovens Livres, da Baixa Cachoeirinha, resolveram me homenagear na sede da entidade com uma placa de “Personalidade do Ano” e um diploma de sócio benemérito da escola. Depois da solenidade, fui obrigado a dar umas aulas de dominó aos simpáticos torcedores da agremiação sócio-esportiva, correndo o risco de ser multado pela Federação Internacional de Dominó (FID), em virtude de nenhum dos meus adversários serem ranqueados.
Atualmente, Cuba lidera o ranking da FID, seguida por Panamá, Venezuela e México. Como a maioria dos brasileiros joga uma merda chamada “passa-bate” e somente na região Norte e em algumas cidades do Nordeste é que se joga o clássico all-five ou muggins (os jogadores ganham pontos quando o total da soma dos extremos do dominó é múltiplo de 5), o Brasil está na 57ª posição do ranking.
Os países caribenhos se tornaram uma referência para o dominó mundial ao se organizarem com federações nacionais, jogadores filiados e copas com participantes estrangeiros. O Panamá saiu na frente de todos e criou sua federação em 1966. Cuba foi o primeiro a declarar o dominó um esporte, em 2003.
A Espanha também avançou e compartilha com os latino-americanos os Congressos Mundiais que estabelecem datas de eventos e aprimoram as regras do esporte. Nos Estados Unidos, a maciça presença dos latinos nos Estados sulistas impulsionou os encontros de jogadores e eventos comerciais.
Desde maio de 2006, o canal televisivo ESPN Deportes (canal da ESPN dedicado à América Latina) transmite o torneio de Las Vegas, equipando-o com celebridades, sotaque castelhano e grandes prêmios.
Já no restante da Europa, é bastante comum o dominó duplo-nove, duplo-doze e duplo-quinze. Nessas modalidades, o maior valor de cada pedra não é o seis. Ele se estende até o quinze, aumentando o número de peças em jogo.
No duplo-seis, o mais conhecido no Brasil, são 28 pedras. Nos outros são 55, 91 e 136, respectivamente.
Há alguns anos, durante uma viagem a Parintins, levei um dominó duplo-nove, mas a partida demorou tanto (era uma dificuldade contar pontos quando havia “carroças” de oito e de nove nas pontas) que desisti de tentar fazer meus parceiros darem um salto evolutivo. Azar o deles.
Bom, mas voltando aos Jovens Livres.
Em 2007, o seu time de masters (jogadores com mais de 40 anos) ia decidir o título do Peladão Masters contra o Arsenal, do meu brother Gonzaga. Resolvi ir ao Clube do Trabalhador para torcer pelos “velhinhos” da Cachoeirinha.
O jogo terminou em 1 a 1, foi pra prorrogação, continuou empatado, e aí foi para os pênaltis. O destaque dos Jovens Livres era um ex-jogador profissional do Santa Cruz, de Recife (PE), chamado Evilásio. Durante o jogo, o sujeito não fez porra nenhuma. Nos pênaltis, ele foi o único jogador dos Jovens Livres que conseguiu isolar a bola na arquibancada.
O Arsenal ganhou de 5 a 4 nos pênaltis depois que um bandeirinha safado anulou uma defesa espetacular do goleiro Nei Capiroto, dos Jovens Livres, alegando que ele saíra do gol antes do Gleison meter o pé na bola. O juiz mandou repetir a cobrança, que na segunda vez foi convertida.
A solução foi comemorar o vice-campeonato invicto (que ainda teve o melhor ataque e a defesa menos vazada) dos Jovens Livres na sede do clube, na Rua Ajuricaba, na baixa Cachoeirinha, cuja festa entrou pela madrugada.
Em 2008, o Jovens Livres deu a volta por cima e ganhou o título em cima da Petrobras. Eu estava com o ombro direito operado por conta de um acidente de percurso no município de Borba e não pude ver o jogo.
Em 2009, novamente o Jovens Livres chegou à final, dessa vez contra o Santos Simonfer, de São Francisco, dos meus brothers Paulo Caramuru, Vicente e Fabinho. Era a primeira vez na história em que o título do Peladão Masters seria decidido entre dois times da Zona Sul.
Na decisão do futebol feminino, o Apolo, também de São Francisco, iria em busca do bicampeonato contra a Nilton Lins, que ele já havia derrotado no ano passado.
Por insistência do Áureo Petita, torcedor fervoroso dos Jovens Livres (apesar de morar em São Francisco), eu, ele, Luiz Lobão e Simas Careca Selvagem fomos assistir as duas finais no Vivaldão.
No primeiro jogo, das garotas, o Apolo fez 1 a zero, a Nilton Lins empatou. O Apolo fez 2 a 1 e a centroavante do time começou a perder gols escandalosos embaixo da trave. Era pro Apolo ter enfiado, no mínimo, uns 5 a 1. Como quem não faz, leva, a Nilton Lins empatou o jogo já quase nos descontos. Na cobrança de pênaltis, o time de São Francisco se ferrou. Deu Nilton Lins.
Antes de o jogo principal começar, Luiz Lobão fez um comentário, em voz alta:
– O Santos Simonfer tem um time melhor do que o Jovens Livres, o problema é que o goleiro Deda é muito cabeça quente e acaba prejudicando a equipe!
Coincidentemente, a esposa do goleiro santista estava sentada na nossa frente, junto com meia dúzia de cunhados. Ela não gostou da observação do Luiz Lobão e iniciou um bate-boca federal. Quase que acaba em troca de sopapos, porque a mulher era meio abusada e os seus cunhados, idem. Pelo visto, a família inteira do goleiro Deda era cabeça quente.
O primeiro tempo do jogo terminou zero a zero. No segundo tempo, o Santos fez 1 a zero e, logo depois, 2 a zero.
O time do Alzimar entrou em parafuso e resolveu partir pro tudo ou nada, na base do desespero. Comecei a achar que os Jovens Livres iriam tomar uma sonora goleada, porque o que o Santos perdia de gols nos contra-ataques não estava no gibi.
Faltando cinco minutos para terminar o jogo, eu e o Simas resolvemos puxar o carro. Eu é que não ia var a porra dos Jovens Livres perderem um título mais uma vez.
Encontrei na arquibancada o Edson Jaburu, ex-presidente do GRES Andanças de Ciganos e também torcedor dos Jovens Livres. Enquanto me despedia dele, cantei a bola:
– Fudeu, Jaburu. Esse título é do Santos, não tem jeito! Vou esfriar a cabeça com umas brejas!
Ele riu, meio sem jeito.
Luiz Lobão e Áureo ficaram no estádio para depois irem comemorar a vitória do Santos Simonfer no Bar do Jorge, ali ao lado do campo da Ceam. Havia 20 grades de cerveja e 200 quilos de alcatra esperando pela galera de São Francisco.
A gente mal havia contornado o Vivaldão para entrar na Av. Constantino Nery, quando toca meu celular. Era o Áureo, eufórico:
– Presidente, o Jovens Livres virou o jogo e está ganhando de 3 a 2.
Achei que era trote, mas era verdade.
Em uma virada sensacional o Jovens Livres conquistou o bicampeonato do Peladão na categoria Master. Puta que pariu! E eu não estava lá para ver a presepada!
Como já disse, o time perdia por 2 a 0 para o Santos até três minutos do final da partida quando em uma reação incrível marcou os gols da vitória e garantiu mais um título para a equipe da Cachoeirinha.
O herói do Jovens Livres foi o meia-direita Lico: marcou dois gols de falta e devolveu a esperança ao grupo e principalmente para a torcida que, mesmo quando o time perdia, não parou um minuto de incentivar os jogadores.
– Devemos tudo isso a essa torcida maravilhosa que não deixou de acreditar na gente em nenhum momento – ressaltou Lico.
Ele devia estar falando para o Áureo Petito, porque eu, Luiz Lobão e Simas já havíamos nos conformado com a derrota.
O placar favorável ao Santos foi construído no começo do segundo tempo com um gol de falta de Boca, aos 15 minutos do segundo tempo. O Santos ampliou com Edilson aos 22 minutos.
Tudo caminhava para o título da equipe do São Francisco, quando o goleiro Deda foi expulso e deixou o time em situação complicada.
Como já tinha um cartão amarelo por “fazer cera”, ele recebeu o segundo cartão pelo mesmo motivo e foi para o “chuveiro” mais cedo.
Depois disso, a equipe do Jovens Livres “operou o milagre”.
E aquele Luiz Lobão também tem uma “boca de praga“ da moléstia para ter secado o goleiro Deda daquele jeito…