Por Simão Pessoa
Fevereiro de 1984. Amigos desde o tempo em que moravam no subúrbio carioca de Irajá, Nei Viana e Zeca Pagodinho desembarcaram em Manaus para dar uma força nos ensaios do GRES Andanças de Ciganos, que tinha como puxador de samba Carlinhos de Pilares. A fama da maconha vendida pelo Chico Padeiro e consumida fartamente pelos batuqueiros da Cachoeirinha já havia chegado à Cidade Maravilhosa.
Numa noite de sábado, Zeca Pagodinho estava parado no canto das ruas Parintins e Borba, do outro lado do Top Bar, esperando alguma alma caridosa que lhe fizesse uma presença. Seus parceiros, Nei Viana, Carlinhos de Pilares e Roxinho, haviam saído na caça ao tesouro, mas estavam demorando a retornar com o bagulho.
De repente, o pagodeiro avista Jacó Fernandes, com duas baquetas na mão, se dirigindo para o ensaio na quadra do GRES Andanças de Ciganos. Ele não conhecia o Jacó, mas a fissura falou mais alto.
– Êi, gente boa, será que você podia me fazer um favor? – disparou Zeca Pagodinho.
– Aí, depende… – avisou Jacó Fernandes. – Se estiver dentro do meu alcance…
– É o seguinte, cara! Eu estou a fim de apertar um beise, entendeu? Será que você conseguiria alguma coisa pra mim, de preferência do Chico Padeiro?… – explicou Zeca Pagodinho.
– Chico Padeiro?! Aquilo só vende palha, coentro e bosta de vaca, porra! Bagulho bom quem tem é o Pirarucu, ali no Bodozal da Maués… – avisou Jacó Fernandes, com a experiência de um autêntico rastafári.
Os olhos de Zeca Pagodinho se iluminaram. Ele deu cerca de 200 pilas para o Jacó, que desceu apressadamente a ladeira da Rua Parintins, em direção à Rua Maués.
Duas horas depois, Nego Keko encontra Zeca Pagodinho ainda postado solitariamente no canto da rua, esperando pelo bagulho. O pagodeiro relatou a conversa que teve com Jacó. Nego Keko foi de uma sinceridade cruel:
– Você perdeu, playboy, você perdeu! O cara não volta mais aqui contigo nem pelo caralho… A essa altura do campeonato, ele já deve estar apertando o black com a turma dele… Conheço essa raça!
Zeca Pagodinho ficou mordido:
– Caraco, mano, eu vir lá do Rio de Janeiro pra tomar banho em Manaus… Porra, assim é foda…
E, puto da vida, voltou para a quadra dos Ciganos ainda na maior fissura.
Foi salvo pela chegada providencial de Carlinhos de Pilares com uma pacoteira de erva do Chico Padeiro.