Causos Políticos

Cachaça contra uísque

O governador Aluízio Alves
Postado por Simão Pessoa

Campanha de 1968, para a Prefeitura de Mossoró (RN). O governador Aluízio Alves foi chamado para ajudar o correligionário Antônio Rodrigues, identificado com as causas dos pobres, contra o intelectual Vingt-Un Rosado.

Era a campanha do “touro” – Vingt-Un – contra o “capim”, Toinho. Mas este tinha um grave problema: era alcoólatra.

Comício de encerramento da campanha. Aluízio chamou a mulher de Toinho, Maria Augusta, e disse: “Vou ter que tocar no problema dele, o alcoolismo”.

– Pelo amor de Deus, governador, não toque no assunto.

– Deixe comigo.

Multidão silenciosa. Solene, o governador tirou uns papéis do bolso e começou:

– Vamos perder a campanha. Tenho aqui uma pesquisa. Toinho vai perder.

Um sussurro toma conta dos pasmos eleitores, em um misto de decepção e frustração.

Impávido, Aluízio retoma:

– Vamos perder porque Toinho Rodrigues é alcoólatra.

A balbúrdia se estabelece. As pessoas estão cada vez mais nervosas.

O orador pede silêncio e faz a peroração que marcou um dos capítulos mais vibrantes da história do palanque político:

– Ao chegar a Mossoró, passei pelo açougue e vi, assombrado, o preço da carne, uma carestia! Passei pela farmácia e vi o absurdo que são os preços dos remédios!

O governador continuou os relatos sobre preços e a carestia e histórias de pessoas que não conseguiam comprar alimentos.

Citou Pedro dos Anjos, Deca de Antônio Gadelha, Manoel Bernardino, Chico de Saturnino, compadre Azarias, Tintim, Sebastião, Elpídio, cada um com suas frustrações e lamúrias por não poderem comprar um quilo de carne, um litro de leite, um quilo de feijão.

E arrematava:

– Frustradas, essas pessoas passam pela bodega e pedem um oito de cachaça. Têm vergonha de chegar em casa sem alimentos para os filhos. Tomam sua cachacinha para esquecer as dívidas, a carestia, a falta de grana. Aí, com o tempo, se acostumam a beber.

E começou a fazer a comparação:

– Vocês sabem quanto custa uma garrafa de uísque? Com o preço de uma garrafa dessa bebida estrangeira, dá para comprar 30 garrafas de cachaça. Sabem quem bebe uísque? O Dr. Vignt-Un Rosado, intelectual, rico, de família milionária, que não quer sentir o cheiro de cachaça e detesta pobre. Vamos perder a eleição. Dr. Vingt-Un será eleito. Agora, imaginem a situação. Zé do Peixe chega na prefeitura, com aquele bafo de cachaça, para falar com o prefeito. “Quero falar com esse Vantan”. Ele bebe uísque. Um assessor, engravatado, diz logo: “O prefeito está em reunião. Não pode atender”.

Aluízio conta mais dez casos de bêbados que são expulsos do lugar. A seguir, faz a comparação:

– Imaginem, agora, Toinho, eleito prefeito de Mossoró. Chega na prefeitura o cachaceiro Luiz de Zefa das Baixas. Que vai logo exigindo: “Cadê o prefeito Toim?”. O assessor de Toim cochicha no ouvido dele: “Prefeito, tem um cachacista militante na recepção querendo falar com você”. Mais que depressa, Toinho Rodrigues diz: “Mande, já, o colega entrar”.

Aluízio resolve dar o golpe de misericórdia:

– Mossoroenses! Toinho é a cara do povão simples. Bebe porque tem os mesmos problemas de nossa gentinha. Mossoró precisa eleger um prefeito com a cara do povão. Vamos eleger Toinho. Cada um de vocês sairá daqui com o compromisso de arranjar cinco, seis, dez votos. Podemos, sim, mudar a situação.

A multidão, sob forte emoção, caiu em campo. Foi e venceu.

Mossoró ganhou a cara do prefeito Antônio Rodrigues.

O governador Aluízio Alves, com um discurso simples e direto, mudou o rumo da história. Um marco do marketing político brasileiro.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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