Caxuxa Blues

Belisca, o quase-segurança do Ivan Chibata

Postado por Simão Pessoa

Por Simão Pessoa

Abril de 1987. Atendendo a uma sugestão do Luiz Lobão, o bicheiro Ivan Chibata contratou o famoso Agesilau Belisca, um dos “valentões” mais conhecidos da invocada “turma do Ypiranga”, para ser seu novo segurança. Agesilau ganhou esse apelido quando ainda era criança porque era tão malvado e violento quanto o Belisca-A-Lua, um dos cinco diabos da famosa Pastoral do Luso (os outros quatro eram Luzbel, Trinca Ferro, Come Fogo e Feiticeiro, também chamado de Cramunhão). Com o tempo, o apelido de Agesilau virou apenas “Belisca”.

– Esse tal de Belisca é de porrada mesmo, Lobão? – questionou Ivan Chibata. – Porque arrumei tantos desafetos que tenho que ter alguém pra ser o meu anjo da guarda…

Luiz Lobão riu.

– Porra, Ivan, o Belisca é uma verdadeira máquina de guerra pronta pra matar! – devolveu Luiz Lobão. – Ele joga capoeira melhor que Mestre Gato, tem um murro melhor que o do Rei Zulu, briga karatê melhor que o professor Noguchi e luta kung fu melhor que o professor Sandro José. Além disso, o Belisca conhece as técnicas de krav maga, savate, judô e jiu-jitsu, possuí uma força descomunal, é imune a dor e já deu porrada nos desordeiros Otinha e Paixão, na praça do Palácio Rodoviário. Ele é muito foda, Ivan! Vai por mim…

O bicheiro contratou o novo segurança.

No mesmo dia, Ivan Chibata, em companhia de Belisca, Chico Porrada e Luiz Lobão, foi se embriagar em um boteco lá pelas bandas da Vila da Prata. Era a primeira missão oficial do novo segurança. O tal boteco ficava no final de um beco estreito, de 20 metros de comprimento por meio metro de largura, a popular “serventia”.

Sabem o que é não?… Serventia é o seguinte: você vende um terreno e depois um outro atrás do primeiro, que não tem entrada. Então o da frente deixa ali meio metro de passagem lateral para o de trás, que é chamado de “serventia”. É daí que vem aquele dito popular “a porta da rua é serventia da casa”.

O problema é que bastava um copo de cerveja para o Ivan Chibata ficar valente que nem cobra de resguardo. Com meia dúzia de cervas na cabeça, o bicheiro começou a zoar com o atendimento do boteco. Os nativos, que estavam vendo aqueles sujeitos ali pela primeira vez, começaram a ficar invocados.

Na hora em que Ivan Chibata devolveu uma isca de calabresa argumentando que “aquela merda estava mais ruim do que jerimum cheio d’água”, o cearense dono da birosca resolveu engrossar o caldo. Em menos de dois minutos de discussão, uns dez caras cercaram o quarteto e começaram a distribuir porradas pra valer.

Vendo que iam ser massacrados, Luiz Lobão e Chico Porrada correram para o carro. Como se fosse um oficial de segurança de presidente americano, Belisca limitou-se a proteger o bicheiro com o próprio corpo enquanto dezenas de ripas, cadeiras e mesas eram arrebentadas nas suas costas. Ele saiu conduzindo o patrão pelo beco estreito, com a matilha no seu encalço.

Aguentando estoicamente uma saraivada de chutes, pescoções e socos vindos de todos os lados, Belisca conseguiu levar Ivan Chibata incólume até o carro, abriu a porta e ainda aguentou uns três minutos de ripas, cadeiras e mesas sendo arrebentadas nas suas costas até o bicheiro colocar o cinto de segurança.

Só então entrou no carro e Chico Porrada, que era o motorista, saiu cantando pneus. Belisca tinha apanhado que nem couro de pisar tabaco, mas não dera um pio.

Dentro do carro, Ivan Chibata estava injuriado.

– Porra, Luiz Lobão, mas esse segurança que tu me arranjou é a maior fraude! – reclamava. – O Belisca não é de porrada, ele é de aguentar porrada! Não serve pra mim não…

O novo segurança foi mandado embora no mesmo dia.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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