Por Moacyr Luz
Conforme combinado vamos falar sobre a batata frita.
Ao que eu saiba, só há um jeito de se evitar a gordura da batata frita: não peça uma besteira dessas como tira-gosto em butiquim nenhum. Aliás, batata frita só se come em casa, escondido, e de preferência com a luz apagada, para nem o vizinho descobrir que você deixa a desejar.
Sinceramente, é no tira-gosto que se conhece o futuro amigo íntimo da mesa de bar, aquele confidente, parceiro do peito – esse é! – e, desculpe a curva que eu estou fazendo, não é o amigo de pelada não, porque geralmente esse aí é chato para burro. Só dá para aturar 90 minutos e, talvez, uma pequena prorrogação no vestiário, onde todo mundo disfarça para comparar o tamanho do documento. Não, o amigo de bar é intimo porque já manja a voz quando a boca fica mole de tanta cachaça, e quase sempre lhe dá razão. Mas vamos ao tira-gosto.
Você chega, olha calmamente para o salão, cumprimenta os necessários, já está chegando o chope meia pressão. Então, bate no ombro do confidente, fala uma novidade qualquer e pede o cardápio.
– Ih, rapaz, hoje foi cozido no almoço. Será que ainda tem o caldinho, um peito desfiado, a costelinha ou o lombinho defumado?
Este conhece.
Ou então você chega, esbarra na mesa de trás e ainda força a cadeira para todo mundo ficar apertado, reclama da espuma do chope, diz que assim é roubo e coisa e tal, bate de mão aberta na bochecha do amigo peladeiro, fala que vai chover e pede para o garçom, puxando pelo braço de dobrar as costas:
– Aí, faz uma porção de batata frita, na manha, hein… E não esquece o ketchup.
É duro, meu irmão.
Assim que der vou falar de cerveja gelada e do meu tio Ernesto, que guardava a garrafa aberta na geladeira com uma colher para não perder o gás.
Papo reto com Antônio Carlos da Fontoura
Conheci artisticamente o Fontoura assistindo a um filme que ele dirigiu sobre o Heitor dos Prazeres. Um dia, estou eu sentado no bar da minha rua quando entra o nosso cineasta, sempre de sorriso fácil, pedindo uma cerveja. Com muito orgulho, descobri ser esse novo amigo também tijucano, além de entender tão bem de subúrbio quanto eu gostaria. Temos um projeto: um filme sobre três gerações de sambistas de bairros diferentes, “A cidade e o samba”.
Você é defensor da batata frita em butiquim?
Pedir batata frita em butiquim é quase tão grave quanto pedir uma purinha no McDonald’s.
Se você convidar o Jaguar para a saideira num butiquim da cidade, acha melhor pedir um jiló em respeito ao craque ou recorre à famosa bata frita?
Eu não cruzo com jiló, mas se o Jaguar encarar a iguaria eu peço em homenagem ao mestre.
Você acha que malandro só não encara a batata frita em birosca por vergonha de se assumir bobão?
Malandro que é malandro mesmo pede cerveja e bica o prato do bobão que pediu batata frita.
O problema da batata é o óleo ou esses canolas da vida resolvem a situação?
Quem me prova que tem canola na lata de óleo de canola?
E a cara-de-pau de colocar o ketchup em cima, você tem?
Batata frita não combina com ketchup. Aliás, pizza também não combina. Afinal, o que combina com ketchup?! Acho que eu vou perguntar pros meus netos.
Depois de um belo porre, caindo pelas tabelas, você também usa a desculpa da batata frita como causadora da ressaca?
Claro, foi aquela batata frita feita sem óleo de canola que me deixou nesse estado só pode ter sido.
E você tem alguma dica pra ressaca?
Óleo de fígado de bacalhau, mas se estiver em falta, às vezes, uma cervejinha resolve.
Você já recuou diante de uma sardinha de balcão e pediu, com o dedo em riste, “uma batata frita, por favor”?
Heresia! Jamais trocaria uma sardinha de balcão por um prato de batata frita.
E existe algum lugar em que você afirme categoricamente: “Aqui se serve uma batata frita maravilhosa!”?
Lá em casa. Estão todos convidados.
Você já olhou de lado para um sujeito que, em pé, num bar do Buraco Quente, pediu essa iguaria?
Com toda a delicadeza, perguntei se ele não ia por ketchup na batata frita dele…