Boemia

Bares do Otelo

Postado por Simão Pessoa

Por Jaguar

Otelo Caçador, durante mais de trinta anos, fez n’O Globo Penalty, a página de humor esportivo (leia-se futebol) mais famosa da imprensa brasileira, e agora está repetindo o sucesso no Extra, todas as segundas.

Otelo demarcou os seus limites no Leblon, onde mora e de onde não sai há mais de vinte anos: ao norte, o Bracarense, a leste, o Clipper, e ao sul e a oeste, o Bar Senegal, contrariando a geografia que aprendemos no colégio, ou seja, qualquer lugar é limitado por quatro pontos cardeais. O universo de Otelo só tem três pontos, uma vez que o sul e o oeste são no mesmo lugar.

Este repórter, na sua insaciável busca do prazer (e de assunto), resolveu refazer a caminhada diária do legendário boêmio.

Começamos pelo Bar Senegal. Fica a vinte metros do apartamento do Otelo.

É um boteco que de especial só tem o nome. Fica numa galeria e tem mesinhas onde se pode comer e beber em paz. Os PF’s são satisfatórios, tem de língua com purê a filé à campanha, pratos fartos e bem temperados.

Vamos em frente, seguindo a rota do Otelo. Subindo pela Ataulfo de Paiva, chegamos à esquina de Carlos Góes, duas quadras adiante, onde fica o Clipper. Tem cinquenta anos e foi reformado há algum tempo. Eu estranhei – sou um sujeito conservador, pelo menos em matéria de botecos –, achei que ficou com cara de lanchonete. Mas como os fregueses – e o pessoal que atende no balcão – continuam os mesmos, já me acostumei, com a tibieza de caráter típica dos biriteiros.

O Clipper está cheio de novidades: tem gurjão de peixe ao creme de alcaparras, kafta, sopa de ervilha e hambúrguer (muito mais gostoso que o do McDonald’s, do outro lado da rua). O pernil é um dos melhores do Rio (quando não é da véspera) e vale por uma refeição. O item mais barato: pão com manteiga – R$ 0,50. E o “garoto” continua ótimo, sem essa de pedofilia, é chopinho em copo pequeno. Nas mesinhas de armar na calçada servem um bife a cavalo muito melhor que o do Antiquarius.

Finalmente chegamos ao extremo norte do universo de Otelo: o Bracarense. Passei um tempão sem aparecer lá. Primeiro porque o dono, Armando, não cobrava a minha despesa. Nem a do João Ubaldo. Constrangidos, deixamos de frequentar o lugar.

Depois que o Armando foi assassinado, num desses crimes que a polícia nunca vai elucidar (mesmo porque nem devem saber o que significa isso), aí mesmo foi que sumimos do lugar. Só apareci tempos depois. O João, não, porque parou de beber, coitado.

Encontrei velhos companheiros de birita, como Dalmo Castelo, parceiro de Cartola, e João Pato, presidente vitalício da Banda do Leblon, e, impávido, Orlan Divo, que canta o fino da bossa nova se acompanhando no chaveiro.

Armando é a chamada perda irreparável, mas o pessoal está se desdobrando para agradar e clientela, contando com o Dirceu, grande tirador de chope, Alaíde, que pilota o fogão da casa com a classe de uma porta-bandeira, e o Chico, garçom onipresente. A costelinha e a carne-seca desfiada continuam dentro do índice olímpico. Um dos orgulhos da casa: Tom Jobim era fissurado na dobradinha da Alaíde.

Bar Senegal. Av. Afrânio de Melo Franco, 170, loja A. Leblon. Das 6 da manhã 1 da madrugada.

Bracarense. Rua José Linhares, 85. Leblon. Tel. 294-3549. De segunda a sábado das 7 da manhã à meia-noite, domingo até as 8 da noite.

Clipper. Rua Carlos Góes, 263-A, esquina de Ataulfo de Paiva. Leblon. Tel. 259-0148. Diariamente, das 8 da manhã à 1 da madrugada.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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