Boemia

Festa de fim de ano no butequim

Postado por Simão Pessoa

Por Moacyr Luz

A empresa pode oferecer passeios de escuna com direito a caipirinha de frutas tropicais, panetones ressecados, o CD do Roberto Carlos (aquele em que ele está de blusa azul), pode até sortear um carro, mas nada se compara à expectativa da festa de fim de ano da empresa. Nada.

Não sei se essa prática surgiu nos Estados Unidos para justificar o strip-tease, ou tornou-se obrigatória na Rússia a fim de que passassem despercebidos os porres do Boris Yeltsin, mas o desdobramento dessa efeméride é sentido como a tal história da pedrinha que caiu num rio do Uruguai e provocou tsunamis na Indonésia.

Tenho novos amigos íntimos que narram aventuras com suas, secretárias no braseiro de churrascarias ou nos mictórios dos piores butiquins, o que torna toda a minha vida sexual um atestado de celibato puro. A tática é esperar as músicas mais bregas possíveis para dar o bote. As mulheres dançam aquele ritmo indecifrável e se acham ausentes do mundo real, entrando num transe de liberdade em que o primeiro quadro virado é o marido. Esse título desaparece da razão. O pobre coitado, num boteco qualquer, achando que a mulher está apenas participando de um amigo oculto, sem pressentir que, sim, o amigo está oculto embaixo das saias da desvairada senhora.

Mas o pior aconteceu com Ernesto, um gerente de concessionária que conheci já desempregado no balcão de um bar de subúrbio. Desses bares que na árvore e em frente, no primeiro galho mais alto, está presa por um gancho a gaiola de um passarinho cantador, geralmente rouxinol com o nome de Rivelino. A fama fez isso.

O gerente, respeitador clássico, resolveu incluir nas relações humanas da tal empresa a festinha social do fim de ano. Loja de pouco faturamento, quis organizar no restaurante no qual tinha pendura, para garantir o prejuízo. Dizem que só riu uma vez no trabalho. Foi quando recusou aumento por já sentir recompensado de pertencer ao quadro de funcionários. Preciso dizer o final? Na segunda caipirinha de frutas tropicais, foi visto sobre a mesa, tirando a roupa logo pela calça, justo na hora em que a esposa passava com duas sacolas de compras do jantar familiar.

É por essas e outras que malandro que é malandro nunca dá nem o telefone de bar para mulher. Bebe longe. E por falar em mulher no butiquim…

Papo reto com Antônio Rodrigues

Quando eu conheci o Antônio, ele ainda não era o dono da rede de restaurante Belmonte, tão em moda no Rio de Janeiro. Seus bares eram, então, um pé-sujo no meu bairro, que servia um belo chope, e outro em frente ao Rival, que transformou aquele recanto ao redor do teatro no Beco da Cirrose. Ele me considera padrinho carinhoso do Pedro, seu filho. Eu fico feliz.

Você já organizou em algum bar seu uma festa de fim de ano daquelas de querer se matar no meio?

Casa cheia eu adoro! Só penso em me matar quando não me entendo com o gerente.

Quando tem mais gritaria em butiquim, em Copa do Mundo ou festa de fim de ano?

Copa do Mundo é pior. Nem tenho tevê no bar. É homem subindo na mesa, mulher virando homem e xingando juiz, uma loucura!

O movimento estranho no banheiro muda nessas festas?

Eu fico sempre de olho no banheiro, em qualquer ocasião, porque é sempre perigoso alguém trocar de porta e sair de calcinha ou cueca na mão.

No meio do amigo oculto começa um strip-tease com uma bonitona… Você manda parar ou finge que não vê?

Eu mando parar porque posso perder a razão, mas, assim mesmo, só se exagerar muito, até porque tem freguês que não gosta da mercadoria.

Você já percebeu algum gerente, habitual e sóbrio durante o ano, transformar-se em bêbado chato nessas ocasiões?

Veja os garçons, por exemplo: quando eles formam uma roda fora do trabalho, no mínimo um sai bêbado. Agora, esse gerente de que você fala se transforma: ri à toa, paga a conta de todo mundo, às vezes até afeminado o sujeito fica.

E com você? Vai que você ganha dos fregueses uma caixa enorme e, quando abre, saiu uma mulata de 1m80, num micro biquíni. Pede a nota para trocar por loira, por uma mais baixa ou devolve o presente?

Fico com a mulata de cara. Não posso recusar presente porque fica deselegante.

O bêbado de fim de ano é o pior mesmo?

Nada, é o melhor! No fim do ano tá todo mundo com dinheiro e, com dinheiro, não tem bêbado chato, todo mundo é maravilhoso!

Tem alguma receita pra curar ressaca?

Pro negócio, o bom é manter a dica de que pra ressaca o melhor é tomar outra no dia seguinte.

Você ainda acha que o disco do Roberto Carlos é o melhor presente de amigo oculto ou tem novidade?

O melhor é a alegria e, para mim, presente melhor do que butiquim cheio não existe.

Quem mais se revela nessas festas: o homem ou a mulher?

Mulher. Vira equilibrista, sobe na mesa, fala alto, não tem jeito…

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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