No dia 5 de setembro de 1850, o Imperador D. Pedro II sancionou a Lei nº 582, aprovada pelo Senado e referendada pelo ministro do Império, Visconde de Monte Alegre, elevando a Comarca do Alto Amazonas à categoria de Província do Amazonas.
A grande aspiração do povo do antigo Lugar da Barra do Rio Negro, defendida ardorosamente no parlamento imperial por D. Romualdo Antônio de Seixas, Marquês de Santa Cruz e João Baptista Figueiredo Tenreiro Aranha, era atendida depois de tantos anos de luta.
O primeiro presidente da Província do Amazonas foi também um dos maiores defensores de sua criação no Parlamento do Império: o deputado paraense João Baptista de Figueiredo Tenreiro Aranha, filho de Bento de Figueiredo Tenreiro Aranha (considerado o primeiro grande poeta amazonense), tendo nascido na antiga Mariuá, atual Barcelos, em 1759, e, depois de adulto, se mudado para Belém, por onde se elegeu deputado.
O deputado Tenreiro Aranha chegou à cidade da Barra do Rio Negro no dia 27 de dezembro de 1851, viajando no navio a vapor Guapiassu. Assumiu o cargo de Presidente e instalou a Província do Amazonas no dia 1º de janeiro de 1852, em solenidade realizada na Câmara Municipal, que funcionava num sobrado de taipa de propriedade do vereador Alexandrino Magno Taveira de Pau Brasil, situado no caminho do Pelourinho, depois travessa da Imperatriz, rua Oriental, hoje rua da Instalação da Província.
Tenreiro Aranha governou apenas sete meses. Viajou ao Rio de Janeiro para tomar parte nos trabalhos legislativos como deputado do Pará e ao regressar foi surpreendido em Belém com o decreto de sua exoneração “a pedido”.
A respeito de Tenreiro Aranha, o ex-governador e historiador Arthur Cezar Ferreira Reis deixou essas observações: “Em sua curta gestão, montou as repartições necessárias ao serviço público (…). Organizou a instrução primária, dando-lhe regulamento, magnífico para a época, e projetou a criação de um estabelecimento de ensino primário normal, onde se habilitassem os professores das escolas criadas e por criar”.
No livro “Um Olhar pelo Passado”, publicado em 1897, o filho de Tenreiro Aranha, jornalista Bento Aranha, que tinha o mesmo nome do avô, deixou escrito esse texto a respeito da capital amazonense:
“Em 1852, a villa da Barra, hoje cidade de Manaus, conservava-se tal qual deveria ter sido em 1832, tendo menos população e numero maior de seus edifícios em ruínas. Por um croquis da planta da villa, que foi traçado a vol d’oisseau por meu sempre lembrado pai – João Baptista de Figueiredo Tenreiro Aranha, nos primeiros dias do referido anno de 1852 (….), era cortada a cidade da Barra, ao norte pelo igarapé da Castelhana, que deságua no da Cachoeira Grande e pelo dos Remedios (Aterro), no logar denominado Mocó, cujas águas lançam-se no Rio Negro. Este último igarapé dividia o bairro da Republica do dos Remédios.
Ao Occidente o igarapé da Cachoeira Grande limitava a cidade, e entre elle e o do Espírito-Santo corriam os igarapés de S. Vicente, cuja fonte estava situada na extrema Occidental da rua da Palma, hoje denominada Saldanha Marinho; e o da Bica, seu affluente, que nasce na rua 10 de Julho, ainda não existente nessa epocha, e cujo leito se estende ao longo do Largo da Pólvora, formando com o igarapé da Cachoeira Grande o arrabalde denominado Cornetas e Sacco do Alferes.
Abaixo do igarapé de S. Vicente desaguava no Rio Negro um outro que denominava-se de Seminário, cuja nascente era na rua Brazileira, tendo sido transformado depois na praça da Imperatriz. Esses dous igarapés formavam o bairro de S. Vicente, assim como o do Seminário e o do Espírito-Santo o bairro que tomava deste o nome. O igarapé de S. Vicente lança-se por duas boccas no Rio Negro e forma a ilha de S. Vicente, onde se acha installada a enfermaria militar. Também deságua no mesmo rio o igarapé do Espírito-Santo, cuja nascente estava próxima do logar onde se acha edificado o theatro”.
Alguns anos antes, em 1865, Elizabeth Agassis, mulher do cientista suíço Louis Agassis, também escrevera suas impressões sobre o antigo Lugar da Barra:
“Que poderei dizer de Manaus? É uma pequena reunião de casas, a metade das quais parece prestes a cair em ruínas, e não se pode deixar de sorrir ao ver os castelos oscilantes com o nome de edifícios públicos: Tesouraria, Câmara Legislativa, Correios, Alfândega, Presidência. Entretanto, a situação da cidade, na junção do Rio Negro, do Amazonas e do Solimões, foi das mais felizes na escolha. Insignificante hoje, Manaus se tornará, sem dúvida, um grande centro de comércio e navegação.”
Na verdade, a capital da Província do Amazonas ainda não era bem uma cidade. Nas ruas estreitas, a maioria de chão batido, mal iluminadas com lampiões a querosene, as casas eram poucas, quase todas muito humildes e cobertas de palha. Pontes de madeira ligavam os núcleos de São Vicente, Matriz e Remédios. A sede do governo era um sobrado alugado, feito de taipa. A água chegava às portas das casas nas carroças dos aguadeiros. Dados da época indicam a existência de seis praças, dezesseis ruas, 243 casas e cerca de três mil habitantes.
As receitas da Província eram minguadas e a economia, incipiente. Já floresciam, porém, as atividades mercantis, impulsionadas com o tráfego dos navios a vapor da Companhia de Navegação e Comércio da Amazônia, do Barão de Mauá, e da Companhia Fluvial do Alto Amazonas, de Alexandre Amorim. Vinte e poucos anos depois, a tímida aldeia de 1865 estaria convertida no grande pólo de negócios da borracha, surpreendendo o mundo com seu perfil de cidade cosmopolita.
Em 1848, foi criado em Manaus o Seminário de São José e, em 1869, o Liceu Provincial, onde se aprendia Filosofia, Retórica, Poética, Latim, Francês e Inglês, além das matérias básicas (Português, Álgebra, Geometria, Literatura, etc). O Asilo de Nossa Senhora da Conceição dedicava-se à educação de meninas. A Escola de Educandos Artífices formava alfaiates, sapateiros, torneiros e chapeleiros.
Em poucas décadas, a consciência política sedimentada nas lutas pela criação da Província produziria uma elite cultural expressiva. Na cátedra, na tribuna, na literatura, na política, na administração pública, destacavam-se Gustavo Adolfo Ramos Ferreira, Pedro Luiz Simpson, Aprígio de Menezes, Henrique Amorim, Joaquim Sarmento, Felismino Coimbra, Lima Bacury, Felix Dácia, Gregório de Morais, Lourenço Pessoa e Torquato Tapajós – “o poeta amado da terra, então no sonho azul de seus dezoito anos”, como disse Genesino Braga no livro “Chão e Graça de Manaus”.
O primeiro jornal, o “Cinco de Setembro”, de Manuel da Silva Ramos, que circulara pela primeira vez em 3 de maio de 1851, passando em seguida a denominar-se “Estrella do Amazonas” (7 de janeiro de 1852), desaparecera em 1865, mas em seu lugar surgira o “Amazonas”, de Antônio Cunha Mendes, um jornal político que teve vida longa e chegou à República. O “Commercio do Amazonas”, em circulação desde 1869, dirigido por Gregório José de Morais, era um jornal absolutamente imparcial e moderno.
A Sala de Leitura, criada em 1870 pelo presidente em exercício da Província Clementino José Pereira Guimarães e instalada no ano seguinte pelo presidente José de Miranda da Silva Reis, foi o embrião da Biblioteca Pública Provincial, criada posteriormente pelo presidente José Lustosa da Cunha Paranaguá.
O progresso começa efetivamente a chegar à cidade a partir da implantação da navegação comercial a vapor, inicialmente restrito a navios brasileiros e das repúblicas vizinhas. O marco desse processo foi a viagem do vapor Marajó, de propriedade da Companhia de Navegação do Amazonas, em 1º de janeiro de 1853. Tratava-se de uma linha regular entre as cidades de Manaus e Belém que durava apenas 10 dias.
Os horizontes se expandem com a abertura do Rio Amazonas à navegação internacional (Decreto nº 3.749, de 7 de dezembro de1866, de D. Pedro II). Em 1874, chega a Manaus o navio Mallard, iniciando o ciclo de navegação entre Manaus e os portos da Europa, impulsionando a riqueza advinda da borracha.