Por Danilo Brandão
Prisão. Eis o que define nosso velho safado. Hank – como era conhecido – não era um exemplo, nem fazia questão de ser. Nunca foi um escritor convencional, nem haveria como ser. Sua poesia, sem métrica e rudimentar, irritava os críticos da época. Tais opositores a chamavam de amadora e suja.
A prosa, por sua vez, também não fugiu das duras críticas. Os temas escolhidos por Bukowski não agradavam a nata da intelectualidade estadunidense. Tudo bem, ele os odiava. Assim como odiava a quase todos em sua volta. Odiava até a si mesmo.
Buk jamais foi um exemplo de pessoa. Por alguma razão, nasceu sem compreender o jogo social. Aquele contrato invisível que fazemos ao nascer em uma sociedade organizada: sorria para os desconhecidos, ajude os idosos, faça sua doação anual para a igreja mais próxima, seja simpático em uma reunião de família…
Quase todos nós fazemos tais coisas sem ao menos nos darmos conta. Buk não fazia. Xingava todo esse jogo, todas as pessoas, todos os contratos. Bebia toda sua existência. Afogava-se na sociedade e em todas suas hipocrisias. Tragava cada dor que sentia e não eram poucas.
Seus romances, sua maior contribuição para o mundo literário, são um espelho de sua alma. Henry Chinaski é seu alter ego. A criação de Henry é uma tentativa de esconder-se em uma fresta de ficção em suas obras. Bukowski está nu em suas histórias. É ele escrevendo em cima de um alter ego. São seis romances e mais de 10 coletâneas de poesias, tudo sobre seu universo. Corridas de cavalos, prostitutas, bares e bebidas são os seus protagonistas. Amor, vazio e hipocrisia da sociedade norte americana são os seus temas. Nada em Buk foge disso.
A fascinação que o escritor gerou nos jovens da época pode ser explicada por esse caminho. Buk não fugia de si mesmo. Coisas que os intelectuais, em nenhum lugar do mundo, nunca foram muito bons em fazer. O poeta mostrou para uma geração que não adianta fugir dos seus monstros pessoais, eles sempre te perseguem. Por isso conseguiu, ainda em vida, sucesso em sua carreira literária. Um pouco tarde, é verdade. Bukowski trabalhou por mais de vinte anos no correio de sua cidade para manter-se, antes de, finalmente, explodir como escritor.
Nada de excessos ou longas descrições pomposas. Buk era avesso a tais mesquinharias da linguagem. Era seco, direto, como a vida. Seu mais célebre romance teve sua primeira edição publicada em 1978. Woman (“Mulheres”) é mais um flash da vida do poeta Henry Chinaski, mas, dessa vez, as protagonistas são as mulheres de Henry. Todas juntas – são mais de quinze! – formam uma só.
São personagens distintas, cada uma com características, visões de mundo, fisionomias diferentes. Entretanto, a junção de tais personagens é a personificação de uma coisa: o fracasso do ato de amar. Tudo que Henry vive no romance é para mostrar que, não importa quem você seja, não importa quem esteja do seu lado, o amor sempre fracassa.
Vocês sempre vão perder quando o assunto for amar. Seja ficando com o mesmo parceiro o resto da vida ou trocando como se troca de camisetas. Essa é a mensagem que o velho deixa para nós.
Seu pessimismo tem uma influência direta da obra de Fiódor Dostoiévski, suas angústias se assemelham às do escritor russo. Sua raiva e agressividade são facilmente, compreendidas em suas histórias.
Buk as escrevia, na maioria das vezes, bêbado. A cada linha que escrevia vivia um pouco mais. Sentia-se um pouco mais leve. Grita com o leitor, desabafa sua existência. Não pratica a autocensura. Pelo contrário, jorra seus pensamentos na folha de papel em branco.
O filósofo e crítico literário Jean Paul Sartre disse que Bukowski é o maior poeta da América. O que, francamente deixaria Buk incomodado. Ao maldizer a vida o escritor não queria ser compreendido, só queria livrar-se de sua existência.
Isso aqui não é um texto em sua homenagem. Situações como essa deixariam nosso velho safado desolado de tão triste. Isso é uma ode.
Viva Bukowski e sua crueza ao nos contar sobre a vida!