Causos Políticos

Dois tucanos não se bicam

O deputado federal Artur Virgílio Neto e o senador Artur Virgílio Filho
Postado por Simão Pessoa

Filho do senador Artur Virgílio Filho, Artur Neto nasceu em Manaus, em 15 de novembro de 1945, mas passou a adolescência e a juventude no Rio de Janeiro, onde se formou em Direito. Ele se filiou ao MDB em 1966.

Foi professor de inglês e francês, tendo realizado cursos de aperfeiçoamento nas Universidades de Michigan (USA) e Cambridge (UK). Diplomata de carreira, concluiu o Instituto Rio Branco em 1976.

Foi candidato a deputado federal em 1978, pelo MDB, ficando na primeira suplência. Em 1982, se elegeu deputado federal pelo PMDB.

Exemplo raro de cafuzo sem melanina, daí o apelido de “Macaxeira”, Artur Neto virou político por uma contingência familiar.

Em dezembro de 68, nas vésperas do AI-5, o ex-líder do PTB no Senado e então vice-líder do MDB, Artur Virgílio Filho, fazia um discurso destemperado, valente, raivoso, denunciando os horrores da ditadura militar, numa sessão do Congresso.

– Que nos fechem hoje, mas com o povo que nos assiste ao nosso lado, e não nos fechem amanhã, ingloriamente, com o aplauso do povo brasileiro, como aconteceu em 1937! – vociferava o senador.

Vice-líder do MDB na Câmara e amigo de Artur Virgílio, o deputado Paes de Andrade pede-lhe um aparte, para se solidarizar com ele. Artur Virgílio faz que não vê. Paes insiste, Artur Virgílio não dá a mínima.

Quando desceu da tribuna, Paes foi lhe cobrar:

– O que é isso, Virgílio? Como é que você me negou um aparte?…

– Paes, eu hoje não fiz um discurso, fiz um requerimento. Esse discurso é um requerimento de cassação. Você não tinha nada que entrar no meu requerimento. Cumpri meu dever de trabalhista e vice-líder da oposição e sei que eles vão me cassar. Estou indo embora, mas você precisa ficar.

Dito e feito. No mês seguinte, o senador foi cassado.

Catorze anos depois, o filho mais velho estava em Brasília dando continuidade à luta do pai. Dono de um discurso fluente e vigoroso, Neto logo conquistou o Congresso e virou “arroz-de-festa” dos movimentos sociais.

Começaram a chover convites para ele fazer palestras em sindicatos e dar apoio político às greves de trabalhadores em todo o país.

Em 1984, ele estava em Fortaleza, participando de uma manifestação dos professores contra o governador Luiz Gonzaga Mota, o “Totó”, na frente do Palácio da Luz, quando o líder do governo na Assembleia, deputado estadual Ciro Gomes (PDS), veio tomar satisfações:

– O senhor não tem vergonha de vir lá do Amazonas participar dessa baderna?… – disparou Ciro, visivelmente irritado.

De cima do trio elétrico, Artur Neto não negou fogo:

– Vergonha devia ter o senhor, que serve com fidelidade canina a um ditadorzinho provinciano com nome de vira-lata. Quem esse Totó pensa que é pra fazer essa cachorrada com os briosos professores da terra de Iracema?…

A multidão aplaudiu ruidosamente, mas o bate-boca entre os dois logo enveredou pela baixaria e contribuiu para torná-los inimigos irreconciliáveis até hoje.

Em 1986, Neto se filiou ao PSB e foi candidato a governador pela oposição. Perdeu para Amazonino (PMDB), apoiado por Mestrinho.

Em 1988, foi candidato a prefeito de Manaus, de novo pela oposição, e derrotou Mestrinho (PMDB), apoiado por Amazonino.

Em 1989, a pedido do senador Mário Covas, se filiou ao PSDB.

Em 1990, Ciro Gomes se elegeu governador do Ceará pelo PSDB.

No ano seguinte, o ex-vereador Robson Tiradentes, na época um dedicado aspone de Artur Neto na prefeitura, embarcou num avião em Teresina (PI), com destino a Brasília, quando notou o governador tucano lendo um jornal, ao lado de um assento desocupado. Inocente, puro e besta, Robson sentou-se ao lado de Ciro e puxou assunto:

– Eu sou um grande admirador do seu trabalho, governador! – babou ele. – Acho que o senhor está fazendo um governo pai d’égua!

Ciro, com aquele seu ar imperial, dobrou o jornal, virou-se para o desconhecido e o interpelou:

– É? E quem é você?…

– Ah, eu sou lá de Manaus e trabalho com um grande líder do seu partido…

– É? E quem é ele?…

– O prefeito Artur Neto, governador!

Ciro ficou olhando para Robson como se estivesse analisando um inseto.

Aí, espumando de ódio, rodou a baiana:

– O senhor é muito atrevido! Muito folgado! Retire-se daqui agora mesmo! Retire-se agora mesmo ou vou perder a compostura!!!

Com medo de ser estapeado, Robson trocou de lugar.

Só foi entender a história quando contou o incidente para o prefeito Artur Neto. Que, claro, morreu de rir.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

Leave a Comment