O portelense João Batista Nogueira Júnior, mais conhecido musicalmente como João Nogueira, faleceu na madrugada do dia 6 de junho de 2000, vítima de um enfarte.
João era um dos melhores cantores de samba do país, com uma voz maliciosa e divisão única.
Carioca, aprendeu a tocar violão com o pai, o advogado e músico João Batista Nogueira.
Na adolescência, começou a compor sambas para os blocos carnavalescos do bairro do Méier, onde morava, até que em 1968 sua composição “Espera, ó Nega” foi gravada por um grupo de sambistas.
Sua estréia profissional foi em 1970, quando Elizeth Cardoso gravou sua música “Corrente de Aço”, inserindo João Nogueira definitivamente no meio musical.
Como compositor, teve músicas gravadas por diversos intérpretes como Elis Regina, Clara Nunes, Emílio Santiago, Beth Carvalho, Alcione e outros, e nos legou alguns clássicos como “Espelho”, “Nó na Madeira”, “As Forças da Natureza” e “Poder da Criação”.
Na década de 80, quando o samba começou a ser abafado pelo mercado fonográfico e pela mídia cada vez mais controlada pelo jabá, João Nogueira fundou o Clube do Samba.
Os bailes lotavam toda sexta-feira, primeiro na sede do Flamengo, no Morro da Viúva, depois na Barra da Tijuca.
O Clube do Samba era frequentado por uma turma da pesada, onde se destacavam Beth Carvalho, Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Clara Nunes, Roberto Ribeiro, Zé Ketti e Nei Lopes.
Cuidando do som havia uma orquestra de samba de roda só com “monstros” consagrados, liderada por Wilson das Neves. Desse clube, João era o presidente.
Em 1985, João Nogueira veio se apresentar em Manaus numa sexta-feira e, assim que chegou na cidade, ligou para o violonista Altairzinho Nunes, dono da Farmácia Nunes e seu velho amigo de longa data, para saber das novidades.
Altairzinho o convidou para saborear um tambaqui na brasa na casa de seu cunhado Coracy Brasil, pai do Edu do Banjo, durante uma roda de pagode que iria rolar naquele sábado. O fundador do Clube do Samba aceitou o convite na mesma hora.
No meio-dia de sábado, João Nogueira chegou à casa de Coracy Brasil com a tropa inteira: Mané do Cavaco, Nicinho do Trombone, Cuscuz do Surdo, os violonistas Dézio e Jorge Simas, e outras “cobras criadas”.
Em meia hora, o pagode já estava rolando solto com a inclusão de músicos locais, como Edu do Banjo, Casqueta, Caio do Cavaco e Mestre Carlito. Haja cerveja, uísque e caipirinha para curar a sede da rapaziada.
Por volta das três da tarde, começaram a ser servidor os acepipes. João Nogueira se aboletou em torno de um pedaço imenso de costela de tambaqui na brasa e mandou ver.
Enquanto se deliciava percebeu que, de vez em quando, alguém se levantava da mesa, caminhava em direção a uma pimenteira no fundo do quintal, tirava uma porção de pimentas vermelha, retornava pra mesa, esmagava meia dúzia delas no prato, colocava um pouco de azeite de oliva, farofa e tucupi, misturava tudo e mandava pro bucho.
O sambista não se conteve:
– Que pimenta é essa? Parece com pimenta dedo-de-moça…
– Essa aí é a pimenta-malagueta, uma espécie de prima malvada da dedo-de-moça – explicou Caio do Cavaco. – A dedo-de-moça quase não queima, mas essa aí é ardida pra caralho…
– Ah, é? Então deixa eu experimentar… – devolveu o sambista.
– Vai com calma, João, que essa malagueta não é pra qualquer um! – avisou Edu do Banjo.
João Nogueira nem ligou. Talvez invocado com o pequeno tamanho da pimenta (a dedo-de-moça também é vermelha, mas tem três vezes o tamanho da malagueta), ele esmagou cinco pimentas num pires, colocou azeite de oliva, um pouco de farofa, misturou tudo e jogou no bucho.
Com trinta segundos, o sambista se levantou da mesa e se jogou dentro da piscina, com roupa e tudo. Quando emergiu, começou a gritar:
– Minha boca está pegando fogo! Minha língua está pegando fogo! Meu beiço está pegando fogo! Tragam gelo, pasta de dente, açúcar, qualquer coisa, que eu estou pegando fogo!
Dito isso, ele voltou a mergulhar.
Quando, cinco minutos depois, a ardência foi debelada, João Nogueira explicava a situação:
– Que sufoco, meu compadre, que sufoco! Essa pimentinha é veneno de cobra! Eu não sabia o que ardia mais, se era a minha boca nesse momento ou se ia ser o meu lorto mais tarde, quando a bicha estivesse saindo… Eu sofro de hemorroidas, compadre! De hemorroida de botão!
Nunca mais o sambista se aproximou de pimenta-malagueta.