Humor

4 de junho. Pontos de interrogação

Postado por Simão Pessoa

Por Luis Fernando Verissimo

Nada mais triste do que um álbum de fotografias antigas. A tia Mimi ali, de saia rodada, e você sabendo que naquele momento ela está dentro de um caixão no cemitério, certamente com péssimo aspecto. Ou então você mesmo com um topete juvenil, com a cara de quem pensa que o Gumex nunca vai acabar.

Pior é fotografia de grupo em que você vai eliminando um a um com o dedo – esse caiu de uma janela, esse foi pra Sergipe, esta, coitada, casou com um numismata – e todos estão sorrindo, sem saber o que os espera.

Olhando a fotografia oficial da nossa delegação na Copa nos perguntamos não o que os espera mas o que nos espera. Que futuro essa turma nos prepara? Que fim eles vão nos dar?

Na distribuição de pontos de interrogação pelo solene grupo da foto, um teria que ser colocado sobre a cabeça de Taffarel. Dizem que ele voltou a ser o Taffarel de antanho, a maior vocação natural para goleiro a aparecer no país desde o Veludo. (Veludo, para quem nasceu há pouco, era reserva do Castilho no Fluminense e tão bom que também era reserva do Castilho na seleção).

Mas Taffarel tem fases, o que é normal num ser humano mas inconcebível num goleiro. Quando os jogos forem para valer, ele será o grande Taffarel ou Taffarel numa das suas fases?

Outro ponto de interrogação deve pairar sobre a nossa zaga. Ricardo Rocha não costuma perder viagem, quando não pega na bola pega no que estiver mais perto, geralmente o calcanhar do atacante. Mas como tem o hábito de entrar de carrinho, quando não acerta nem a bola nem o calcanhar fica no chão, que é o último lugar onde queremos ver nossos zagueiros.

Ricardo Gomes sofreria de falta de mobilidade na cintura, justamente numa posição em que o que se quer é uma rumbeira que também saiba cabecear. O que nos preparam os Ricardos?

Branco, claro, é um ponto de interrogação interminável. Dunga é outro. Sou dunguista, mas concordo que ele também abusa do carrinho e passa tempo demais deitado. Raí talvez seja o maior ponto de interrogação do grupo, depois do Branco.

O maior mistério brasileiro dos últimos tempos era por onde andava o futebol do Raí. E a grande atual é: ele voltará a tempo para a estreia na Copa? Só quando Raí tocar na bola pela primeira vez no jogo contra a Rússia saberemos se Raí e seu futebol se reintegraram, ou se ele continua sendo apenas um invólucro à espera de um futebol sumido.

E só depois da Copa poderemos olhar a fotografia do Romário, ali, perfilado entre seus companheiros, e sacudir a cabeça e dizer uma das duas coisas: ou “Não é que ele era um gênio mesmo?” ou “Que blefe, que blefe”.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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