A Zona Franca de Manaus (ZFM) foi idealizada como projeto geopolítico no começo da década de 50, depois que o deputado federal Francisco Pereira da Silva idealizou a criação do Porto Franco de Manaus e encaminhou à Câmara Federal o projeto nº. 1.310 que, após receber várias emendas, foi aprovado em 23 de outubro de 1951.
Entretanto, somente em 6 de junho de 1957, quase seis anos depois, foi que o presidente Juscelino Kubitschek sancionou a Lei nº. 3.173 que criava, em lugar do Porto Franco, a Zona Franca de Manaus, regulamentada posteriormente pelo Decreto nº. 47.757, de 2 de fevereiro de 1960.
Naquela época, as atividades econômicas da região amazônica se concentravam em Belém, capital do Pará, até então a mais importante cidade da Amazônia. Abrigando mais gente e consequente maior mercado, melhor infraestrutura econômica, com um porto praticamente no oceano Atlântico, e tendo ligação terrestre com o restante do País através da rodovia Belém-Brasília, a capital paraense constituía o principal centro de atração para os investimentos regionais. A força centrípeta exercida pela capital do Pará esvaziava o lado ocidental da Amazônia, onde a cidade de Manaus ocupa o centro geográfico.
Com uma população inferior a 150 mil pessoas, a capital amazonense definhava em termos urbanos, econômicos e sociais. Possuindo um ensino superior incipiente, sofrendo escassez de energia elétrica, com um mercado reduzido e de baixo poder aquisitivo, sistemas de transporte e comunicação precários, Manaus oferecia um cenário de fragilidade econômica e sem a menor perspectiva de mudanças.
Para mostrar o grau de hegemonia da economia do Pará, basta citar que em 1964, segundo dados da extinta Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), 97,6% dos investimentos por meio de seus incentivos fiscais na região amazônica eram feitos no estado vizinho. O Amazonas ficou, naquele ano, com apenas 2,4% dos investimentos. Enquanto os incentivos do governo federal permanecessem iguais para toda a Amazônia, a preferência pelo Pará, evidentemente, seria natural e racional.
Manaus era um mero entreposto comercial ligando a economia extrativista praticada no interior do estado com o resto do mundo que ainda consumia produtos exóticos coletados da floresta como madeira em tora, borracha, sorva, castanha, pau rosa, cumaru, breu, resinas, sementes oleaginosas, essências aromáticas, além de animais como quelônios, peixes e seus subprodutos (couros e peles silvestres, por exemplo). Comerciantes e mascates de Manaus procuravam o interior do estado em embarcações, os chamados regatões, para suprir as necessidades das populações. Dispersas nas terras ao longo dos rios, essas pessoas se dedicavam a atividades extrativistas.
Os comerciantes itinerantes forneciam alimentos, tecidos, roupas, remédios e ferramentas, e, em troca, adquiriam os produtos coletados da floresta, em uma típica operação de escambo, sem a presença de moeda – uma relação econômica de característica feudal que mantinha o produtor no nível de subsistência, escravizado aos interesses de intermediários e donos de seringais.
Por conta disso, a Amazônia Ocidental constituía uma imensa área de baixíssima densidade demográfica e econômica, muitas vezes, sem ter a presença física de brasileiros, abrigando enormes e pouco explorados recursos naturais. Com tais características, a região estaria, segundo a versão dos militares pós-golpe de 64, despertando a cobiça internacional.
Esse era o discurso, por exemplo, do historiador Arthur César Ferreira Reis, o primeiro governador amazonense do período militar. Esta hipótese era reforçada com a chegada dos movimentos ambientalistas, que se desenvolveriam no mundo de forma generalizada – principalmente nos países mais ricos.
O Exército tinha vários estudos e ensaios estratégicos citando a problemática amazônica, enfatizando principalmente a parte ocidental da região até as linhas de fronteira internacional. Estes fatos levaram o governo federal a iniciar a elaboração de um projeto de inspiração geopolítica para mudar o quadro existente.
No início do ciclo militar de 64, o projeto atinge maturação e a Zona Franca de Manaus é criada pelo Decreto-lei nº 288, em 28 de fevereiro de 1967. Este foi um dos últimos importantes atos da administração Castello Branco – inspirador e defensor da ideia. Para colocar o projeto em prática, houve um pacto tripartite celebrado entre o governo federal, o governo do Amazonas e a Prefeitura de Manaus, em que cada participante ofereceu uma parcela de contribuição ao conjunto dos incentivos aos projetos que se instalassem na ZFM.
Para atrair investimentos, foram criados incentivos no âmbito dos impostos indiretos que impactavam os custos das empresas como redução de Imposto de Importação (II), isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), restituição de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e isenção de Imposto sobre Serviço (ISS).
A novidade em relação aos incentivos feitos anteriormente na região é que não havia nenhum subsídio ou empréstimo de capital pelos bancos oficiais, como ocorria na Sudam e na Sudene. Mesmo assim, os novos incentivos compensavam as desvantagens de localização da ZFM e a ausência de mercado local.
Visando implementar o Distrito Industrial, a Lei-Estadual n° 63.105, de 15 de agosto de 1968, declarou de utilidade pública, para fins de desapropriação, uma extensão de terras que seriam destinadas à implantação do Distrito Industrial, abrangendo uma área de 16 km² destinada à construção de indústrias que se encaminhavam para Manaus.
A escolha da área ao leste da cidade obedeceu às circunstâncias da chamada “ocupação consciente do sítio urbano de Manaus”, combinando-se, entre outros fatores, ampla área contínua desabitada, contiguidade com a periferia urbana, indústrias sem chaminé – pois os ventos sopram no sentido leste-oeste, do Distrito Industrial para a área urbana –, possibilidade futura de um porto na Ceasa e proximidade do aeroporto de Ponta Pelada (atual Base Aérea de Manaus).
Com a implantação da Zona Franca de Manaus, a capital amazonense rompeu cinco décadas de estagnação econômica. O aporte de capitais atraídos pelos incentivos fiscais dinamizou os negócios e aumentou a oferta de empregos. A população urbana registrou taxas de crescimento superiores á média nacional. Os imóveis da área central atingiram níveis crescentes de valorização, motivando a expansão da cidade para além do Boulevard Amazonas, nos sentidos norte e oeste.
Em pouco tempo, Manaus converteu-se em importante centro comercial de importação, alavancando o turismo doméstico e o segmento de serviços. Durante cerca de 25 anos o setor comercial da Zona Franca foi favorecido pela política de restrição às importações praticada pelo governo brasileiro, que lhe garantiu, até o começo dos anos 90, uma excelente vantagem comparativa: a comercialização de mercadorias importadas não era permitida em outros pontos do território nacional.
Os primeiros projetos industriais começaram a ser implantados em 1972, quando também se iniciou a construção do Distrito Industrial. Três anos depois, o acentuado crescimento dos investimentos do setor já indicava que em breve o Distrito Industrial teria que ser ampliado, incentivando a Suframa a comprar uma nova gleba de 57 km² para garantir a expansão da área inicial. Atualmente, o polo industrial é o principal motor da economia amazonense.