Memória Viva

Arthur Virgílio Filho: Sob o signo da coragem

O deputado federal Arthur Virgílio Neto e o ex-senador Arthur Virgílio Filho
Postado por Simão Pessoa

Por Mário Adolfo

Sob o signo da coragem, Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Filho nasceu em 12 de fevereiro de 1921, em Manaus, Amazonas. Filho do desembargador Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro e de Luíza da Conceição do Carmo Ribeiro, bem cedo aprendeu com o pai que a integridade seria o único caminho a trilhar. E aprendeu bem a lição.

Ao longo de sua trajetória de homem público, buscou atividades que aprimorassem ainda mais o seu sentimento em defesa da justiça, liberdade, democracia, dignidade e solidariedade humana. E os primeiros passos foram nessa direção através da política, advocacia e jornalismo. Foi proprietário do jornal A Gazeta, de Manaus, e também presidente do Aeroclube do Amazonas e, posteriormente, da Cruz Vermelha do Amazonas.

Ingressou na vida pública como chefe de gabinete no governo do Amazonas e, depois, ocupou os cargos de secretário de Finanças e do Interior e Justiça. Seu primeiro mandato foi em 1947, quando foi eleito deputado à Assembleia Constituinte do Amazonas pela legenda do Partido Social Democrático (PSD).

Após a promulgação da nova Carta estadual, exerceu o mandato até janeiro de 1951, ainda na legenda do PSD, e, mais uma vez, em outubro de 1954, foi eleito deputado estadual pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB).

Em outubro de 1958, foi eleito deputado federal pelo Amazonas, cadeira que ocupou no início de 1959. Em maio do mesmo ano, tornou-se vice-líder do PTB e, dois meses após, vice-líder do Bloco Parlamentar de Oposição.

Em 1961, durante o governo do presidente Jânio Quadros, apoiou a política externa oficial sustentando os princípios de autodeterminação, de não intervenção e não alinhamento do Brasil nas disputas entre os blocos hegemônicos internacionais.

Já no governo de João Goulart, em novembro de 1961, apoiou o reatamento das relações diplomáticas com a União Soviética, rompidas em 1947, e a Emenda Constitucional nº 5, que ampliou a participação dos municípios na renda tributária nacional.

Em março de 1962, alinhado ao chamado Bloco Compacto do PTB, grupo que reunia parlamentares de tendências socialistas, foi reconduzido à vice-liderança de seu partido na Câmara. Nesse mesmo ano, no pleito de outubro, elegeu-se senador pelo Amazonas.

Tomou posse no Senado em fevereiro de 1963. No mês seguinte, fez-se líder do PTB e, em maio, vice-líder da Maioria. Em 16 de abril de 1964, após o golpe militar que derrubou Jango, Arthur Virgílio renunciou à vice-liderança do seu partido no Senado. Não fazia sentido nela continuar, uma vez que já havia sido instalado o governo do marechal Humberto Castello Branco.

Com a extinção dos partidos políticos pelo Ato Institucional nº 2 e a posterior implantação do bipartidarismo, filiou-se ao Movimento Democrático Brasileiro (MDB), do qual se tornou vice-líder no Senado em 1968.

Coragem, ousadia e altivez. Mas tudo isso sem perder a ternura. Nem o foco em seu tempo. Essa poderia ser uma tradução do senador Arthur Virgílio Filho. E foi justamente por ser esse homem comprometido com o seu tempo, a preocupar-se com a formação das futuras gerações, que ele se atirou numa luta sem fronteiras e sem tréguas para criar a Universidade do Amazonas.

O poeta já disse que “os homens edificam os sonhos sonhados na infância”. E Virgílio sonhou uma universidade para o Amazonas. Lutou e venceu. Assim, há cinquenta anos, no dia 18 de fevereiro de 1960, o então deputado federal – posteriormente senador – apresenta projeto de lei criando a Universidade Federal do Amazonas.

O projeto teria por base a já cinquentenária Universidade Livre de Manáos, primeira instituição de ensino superior do país. Arthur Virgílio Filho conseguiu que o projeto fosse aprovado como propusera e, com isso, se criou a Ufam. A visão futurista do velho Arthur seria reconhecida em 2008, da tribuna, pelo também senador Arthur Virgílio Neto (PSDB-AM), seu filho:

– Meu pai plantava, na distante região, a semente da primeira universidade federal no Brasil. Só esse gesto revela visão e grandeza suficientes para dele orgulhar-me. Mesmo que nada mais existisse na biografia de meu pai, entremeada de lutas em que se narram heroicas e patrióticas proezas pela defesa da democracia, do Estado de Direito democrático, e contra as tiranias e ditaduras. Uma verdadeira odisseia cívica, que lhe custou, em 1968, a cassação do mandato de parlamentar que lhe fora conferido pelo povo do Amazonas.

No período de trevas, esse feito do velho Arthur ficou no esquecimento. A ditadura militar tentou deletar um dos mais belos momentos da carreira do senador cassado. Mas, quase meio século depois, a Ufam resgata sua memória, por iniciativa do reitor Hidembergue Ordozgoith da Frota.

Designado relator da proposta, o professor Clynio de Araújo Brandão elaborou o primoroso parecer aprovado pelo Conselho da Universidade. Assim, no ano em que se completaram 22 anos de sua morte, a Ufam resgatou o nome desse notável brasileiro. E o campus da universidade passou a denominar-se Campus Universitário Arthur Virgílio Filho. O nome de seu criador.

E mais uma vez a História fez justiça. Era o resgate do nome de um dos mais importantes homens públicos do estado do Amazonas. Hoje, a universidade criada por iniciativa de Arthur Virgílio representa a central do saber, de indiscutível influência no êxito de outra grande ideia, a do Polo Industrial de Manaus, centro de avançada tecnologia de que se orgulha o Brasil.

Cassado em 1969, teve seus direitos políticos suspensos por dez anos por força do Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968. Só em agosto de 1979 foi beneficiado pela anistia decretada pelo presidente João Figueiredo.

Hoje vários segmentos são unânimes em reconhecer a importância para a história do Brasil do papel exercido por ele em defesa do processo democrático e da justiça social. Sua atuação e resistência ao arbítrio são referências fundamentais para as classes políticas do Amazonas e das novas gerações que não o viram atuando. O lançamento deste Perfil Parlamentar faz parte desse resgate.

Arthur parece ser unanimidade no país que tanto amou. Veja, por exemplo, o discurso do senador Marco Maciel (DEM-PE), que teve a facilidade de traduzir Arthur Virgílio como jornalista, como um amazonense “extremamente telúrico” e, sobretudo, como político na plena acepção do termo: “Arthur sempre esteve atento a tudo que fosse virtude e arte do bem comum”.

O que foi complementado por Álvaro Dias (PSDB-PR), para quem Arthur Virgílio Filho era “um homem imprescindível de seu tempo”, que exerceu a política com “honradez, dignidade, ousadia e muita competência”.

No dia 31 de março de 1987 o senador Arthur Virgílio Filho faleceu no Rio de Janeiro. Nesse dia, seu filho Arthur Virgílio Neto traduziu o sentimento que, naquele momento, tomara conta de seu coração: “Nesta data eu morri duas vezes: a primeira com o golpe militar, em 1964. E agora com meu pai”.

(Publicado em 2011, no livro “Perfis Parlamentares nº 59 – Arthur Virgílio Filho”, pela Câmara dos Deputados)

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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