A sujeição ao Grão-Pará incomodava os amazonenses. As questões políticas começaram a agitar o Lugar da Barra. O então governador da Capitania, Manuel Joaquim do Paço, acusado de exercer o monopólio do comércio de drogas do rio Purus, tentou conquistar a confiança do povo para assegurar a sua permanência no poder.
Em 1818, ele iniciou um movimento em favor da autonomia da Capitania de São José do Rio Negro, obtendo o apoio das câmaras municipais das vilas de Silves, Vila Nova da Rainha (Parintins) e Barcelos, que encaminharam memoriais a Dom João VI pedindo o fim da subordinação ao Grão-Pará. Mas os memoriais não tiveram repercussão e a situação da capitania não foi alterada. O clima era de animosidade.
No dia 29 de setembro de 1821, o governador Manuel Joaquim do Paço foi deposto por ter se recusado a jurar a Constituição Portuguesa de 1820 (fruto da revolução que ocorreu na cidade do Porto em 24 de agosto daquele ano).
Revoltada, a população destruiu as principais obras públicas realizadas pelo governador deposto: a capela de Nossa Senhora dos Remédios e o passeio público, arborizado com tamarindeiros. Nomeado para substituir o governador Manuel Joaquim do Paço, Antônio Pires Borralho não chegou a tomar posse, tal a pressão dos populares revoltados.
Daí em diante, por todo o resto do período colonial até os primeiros anos do Império, o governo da Capitania passou a ser exercido por sucessivas juntas provisórias. A terceira delas, eleita no dia 3 de junho de 1822, de acordo com o Decreto das Cortes de 1º de outubro de 1821, era formada por cinco membros: Antônio da Silva Craveiro, Bonifácio João de Azevedo, Manuel Joaquim da Silva Pinheiro, José Vicente Fernandes e João Lucas da Cruz.
Diante dessa junta, a Câmara de Serpa jurou obediência à Constituição Portuguesa, em solenidade realizada no dia 1º de julho de 1822, na pequena matriz de Nossa Senhora da Conceição da Barra do Rio Negro.
A luta pela autonomia da capitania do Rio Negro tinha fortes conotações nativistas, favorecendo a propagação do movimento pró-independência do Brasil, que o governo do Pará se empenhava em evitar e combater.
A carta de José Bonifácio à junta governativa da Capitania do Rio Negro, solicitando a participação de deputados amazonenses na Assembleia Constituinte convocada para o Rio de Janeiro, foi interceptada em Belém.
Os emissários do Príncipe Regente D. Pedro I eram impedidos de subir o rio Amazonas para conquistar adeptos. Mesmo assim, a propaganda pela instalação do governo independente do Brasil tomava conta de Belém, e se infiltrava no Lugar da Barra.
A notícia da proclamação da Independência do Brasil chegou à Barra do Rio Negro com mais de um ano de atraso, no dia 9 de novembro de 1823, sendo recebida com muita esperança e euforia pelo povo, que nesse mesmo dia se reuniu no Largo da Trincheira e proclamou a adesão da Capitania do Rio Negro ao Império do Brasil.
No dia 22, às 9 horas da manhã, realizou-se a sessão solene de juramento de fidelidade e obediência ao Imperador D. Pedro I. Primeiro juraram os vereadores da Câmara Municipal de Serpa, instalada no Lugar da Barra desde o dia 19, com essa finalidade. Depois, a junta governativa e as autoridades civis e militares.
No dia seguinte fez-se a eleição de uma nova junta governativa, constituída exclusivamente de cidadãos brasileiros com acentuado sentimento nativista: Bonifácio João de Azevedo, Raimundo Barroso de Barros, Plácido Moreira de Carvalho, Luiz Ferreira da Cunha e João da Silva Cunha.
Com a proclamação da Independência, as capitanias transformaram-se em províncias, mas o decreto imperial que aboliu as juntas governativas e nomeou os presidentes provinciais não incluiu a Capitania do Rio Negro, marcando a primeira decepção dos amazonenses com o Império.
A segunda decepção não tardaria a chegar. Viria com a Constituição de 25 de março de 1824. Ao contrário do texto submetido à discussão da Assembleia Constituinte, convocada por D. Pedro I em 1823 e posteriormente dissolvida, o artigo 2º da Constituição outorgada pelo Imperador excluiu a Capitania do Rio Negro do elenco das províncias do Império.
Os amazonenses continuaram a ser governados pela junta provisória eleita no momento de sua adesão à Independência. Mas o ouvidor Domingos Ramos Ferreira, argumentando que a legalidade da junta provisória se extinguira com o não-reconhecimento da Província do Rio Negro, proclamou-se chefe do governo. A junta e o ouvidor passaram a exercer governos paralelos, praticando medidas antagônicas prejudiciais ao interesse público e dando início a uma crise política muito difícil.
Para solucioná-la, o governador da Província do Pará, José Felix Pereira Burgos, dissolveu a junta governativa e solicitou ao governo do Império a subordinação do Rio Negro ao Grão-Pará. O Aviso nº 233, de 8 de outubro de 1825, da Secretaria de Estado dos Negócios do Império, referendou a dissolução da junta governativa e incorporou “o território do Rio Negro à jurisdição e administração do Grão-Pará”.
O ouvidor Domingos Ramos Ferreira foi substituído pelo Dr. Manuel Bernardino de Souza Figueiredo, que tomou posse em 28 de julho de 1827. O governo local foi repartido entre a autoridade judiciária do ouvidor, a Câmara Municipal de Barcelos (que se instalou no Lugar da Barra e assumiu o poder civil) e o comandante militar, Hilário Pedro de Gurjão.
Os atritos entre o comandante militar e o poder civil não tardaram a acontecer. A Câmara de Vereadores retornou a Barcelos. Os conflitos entre as autoridades se generalizaram. O comandante Gurjão foi substituído pelo coronel Joaquim Felipe dos Reis, que ao chegar de Belém para assumir o cargo dispensou grosseiramente as manifestações de boas vindas da comunidade local, fomentando ainda mais as hostilidades. A situação tendia a se agravar. O comandante militar era o símbolo da sujeição ao Grão-Pará, que o povo do Lugar da Barra não conseguia mais aceitar.
Em outubro de 1831, a passagem pelo Lugar da Barra do cônego Batista Campos e de mais nove deputados liberais que estavam sendo deportados de Belém para os presídios do Crato (Manicoré) e de São José de Marabitanas, no alto rio Negro, influenciaria as manifestações de revolta que logo seriam deflagradas no Lugar da Barra.
Na noite de 12 de abril de 1832, o soldado Joaquim Pedro da Silva liderou um levante no quartel da Barra, motivado pela falta de pagamento de soldo. O comandante Joaquim Felipe dos Reis tentou conter a revolta e foi morto pelos praças amotinados.
Dois meses depois, no dia 22 de junho, houve uma memorável explosão de civismo no Lugar da Barra. O povo rebelou-se contra a subordinação política ao Grão-Pará e proclamou a criação da Província do Rio Negro. Os religiosos frei José dos Santos Inocentes, frei Joaquim de Santa Luzia e frei Inácio Guilherme da Costa foram os grandes articuladores do movimento. Reunido em assembleia geral, o povo escolheu os seus governantes.
O ouvidor Manuel Bernardo de Figueiredo foi aclamado presidente provisório da Província do Rio Negro e desfilou pelas ruas do Lugar da Barra em companhia da população. Foram também escolhidos para formar o governo revolucionário os cidadãos Boaventura Ferreira dos Santos (comandante militar), Henrique João Cordeiro (secretário geral) e frei José dos Santos Inocentes (procurador). As vilas de Serpa e Barcelos aderiram à Província do Rio Negro, mas Borba recusou-se, guardando fidelidade ao governo do Grão-Pará.
Os rebeldes amazonenses entrincheiraram-se nas Lages e no sítio do Bonfim, com um contingente de 1.000 homens e 30 peças de artilharia vindas do forte de Tabatinga, enfrentando as forças legalistas designadas pelo governo da Província do Pará.
A expedição comandada pelo coronel Domingo Simões da Cunha Bahiana saiu de Belém no dia 5 de maio, com 50 soldados na canhoneira de guerra “Independência”, recebendo o reforço de mais dois navios durante o percurso: o “Patagônia”, em Cametá, e o “Andorinha”, em Santarém. Os rebeldes quase afundaram o “Independência” nas proximidades da Vila de Serpa, mas foram derrotados.
No dia 14 de agosto, Hilário de Gurjão tomava posse mais uma vez no cargo de comandante militar do Rio Negro. Enviado à corte pelos rebeldes como representante da Província do Rio Negro, frei José dos Inocentes tentou chegar ao Rio de Janeiro, mas teve o seu caminho interceptado. Ao chegar à Província do Mato Grosso, foi obrigado a regressar ao Lugar da Barra. O território do Rio Negro não conseguiu interromper a subordinação ao Grão-Pará, mas os ideais autonomistas dos amazonenses continuaram a ser difundidos e fomentados.