Boemia

Bip Bip

Postado por Simão Pessoa

Por Jaguar

O Bip Bip é o único bar que conheço sem finas lucrativos. E o dono, Alfredo Melo – o Alfredinho – carioca da gema, nascido em Santa Cruz, criado em Cosmos e Bangu, desde 71 em Copacabana e no comando do boteco, é uma figura ímpar: enquanto o bar continua no vermelho, sempre dá um jeito de ajudar as pessoas – arrumou um show no Teatro João Caetano para inteirar as despesas hospitalares do grande sambista Wilson Moreira, o Alicate, que esteve temporariamente no estaleiro. E bolou o Clube dos Amigos do Bip Bip para angariar fundos para o projeto Se Essa Rua Fosse Minha, que mantém 30 crianças estudando numa casa em Vila Isabel. O Alfredinho, sozinho, vale por uma ONG. E, ao contrário de muitas ONGs, sem visar o lucro.

Quem chega desavisado pensa que é um bar-fantasma: não tem ninguém atrás do balcão. Por uma razão muito simples: não tem balcão, foi retirado porque ocupava muito espaço. Cadê o dono, cadê o garçom? O Alfredinho é aquele gordinho de barba, óculos e bermuda, tomando cerveja e batendo papo com o pessoal. Garçom não tem, quem quiser uma bebida vai até o fundo do bar, pega a sua latinha, anota a despesa num caderno e paga ao sair.

O Bip Bip é menor que a sua fama: jornais da Dinamarca e Portugal e o maior jornal francês, Le Monde, publicaram reportagens elogiosas sobre esse pequeno grande bar (só 18 metros quadrados).

– O que faz do Bip Bip um bar diferente! – eu quais saber.

– Isso aqui é uma família (é como chama os frequentadores) e tem o lado social, como na Mangueira (Alfredinho é um dos fundadores do camping da Escola, que atende a comunidade). E tem o lado da música. Christina Buarque de Holanda, que me deu a maior força, começou as rodas de samba com Elton Medeiros e Chiquinho Genu, depois vieram outras feras como Nelson Sargento, Walter Alfaiate, Miúcha, Beth Carvalho, Wilson Moreira e rapaziada do chorinho, que dá canja às quartas. Aos domingos tem a roda de samba. O pessoal comparece na base da amizade, não dá pra pagar cachê porque não cobro couvert artístico.
O bar é decorado com fotos de bambas do samba – Cartola, Nelson Cavaquinho, Carlos Cachaça, todos amigos de Alfredinho, – espaço para pendurar mais alguma foto só se for no teto.

Detalhe importante: só abre às 6 da noite. Por quê? Porque Alfredinho é um tremendo boêmio e acorda tarde.

As batidas de maracujá e caju são famosas. Depois das oito pinta uma pizza esperta e aos domingos tem uma sopa de frutos do mar ou de ervilha que levanta até defunto.

Quando Almirante Gonçalves virou rua de pedestres, Alfredinho e a “família” ficaram felizes. Todos esperavam que o Bip Bip pudesse pôr mesinhas no calçadão, como os bares da avenida Atlântica e o Amarelinho, na Cinelândia. Mas, como no samba de Paulinho da Viola, “foi um sonho que passou nas nossas vidas”. Vieram os fiscais e ameaçaram cassar o alvará se o Bip Bip botasse uma cadeira que fosse fora do bar. Uma coisa inexplicável, já que no guia dos 50 melhores botequins do Rio que a Prefeitura lançou, o Bip Bip mereceu os maiores elogios. Os fiscais, que parecem ter birra com o Bip Bip, não devem ter lido o livro. Está faltando jogo de conjunto na Prefeitura, até parece a seleção do Luxemburgo.

Bip Bip. Rua Almirante Gonçalves, 50 D. Copacabana (entre as ruas Sá Ferreira e Djalma Ulrich). Tel. 267-9696.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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