Boemia

Marighela estreia no Festival de Berlim

Wagner Moura dirige Seu Jorge na cinebiografia “Marighella”
Postado por Simão Pessoa

Por Dodô Azevedo

Os alemães sabem que o Brasil nunca foi comunista. Nem sequer socialista. Alemães sabem que o nazismo caçava comunistas. Alemães sabem que o nazismo foi derrotado por comunistas.

Mas na última vez que estive em Berlim, dei um pequeno seminário em um coletivo cultural no bairro de Kreuzberg e estudantes perguntaram sobre o curioso fato de a bandeira do Brasil ser verde e amarela, azul e branca, se o nome do país se chama “Brasil”, que quer dizer “vermelho”, em tupi-guarani, a língua falada pelo brasileiro original.

– Como um país que se chama “Vermelho” não tem a cor vermelha em sua bandeira? – foi o que perguntaram.

Hoje, foi anunciado que a estreia mundial do filme sobre a vida de Carlos Marighela, o guerrilheiro comunista mais célebre do Brasil ocorrerá justamente no Festival de Berlim.

Marighela será o filme mais falado de 2019. É o filme de estreia de Wagner Moura na direção. Do baiano Wagner Moura. Baiano, como Marighela, guerrilheiro, comunista.

Marighela, perseguido, preso e torturado no Brasil pela ditadura de esquerda de Getúlio Vargas nos anos 30. Perseguido, preso e torturado no Brasil pela ditadura de direita nos anos 60.

Marighela, que organizou guerrilha, sequestrou e matou. E, em uma emboscada, foi morto pela polícia. A vida do jovem negro no Brasil.

Em 2017 era forte um boato que dava conta que Mano Brown iria interpretar Marighela no cinema. A vida do jovem negro no Brasil. Quem o faz é Seu Jorge. Que, antes de conseguir vencer o destino que o país impõe a jovens negros, o cumpria: foi mendigo, dormiu na rua.

Jovens negros são, até hoje, como Marighela. Tentando escapar ao destino imposto pela perversidade da sociedade brasileira como dá. Sendo herói para muitos, vilão para muitos.

A pessoa que atravessa a rua se vir um grupo de jovens pretos sem camisa caminhando na direção dela. Jovens vilões.

Encerrei, na época, minha participação no colóquio em Berlim dizendo que eu estranhava era não haver a cor negra em nossa bandeira.

Então um dos participantes, um alemão, professor de engenharia, observou:

– Me parece que vocês estão em guerra há centenas de anos, mas o lado onde mais morrem pessoas não se deu conta disso.

É comum ver algo com maior clareza quando observado à distância. Que alemães, então, sejam o primeiro a julgar Carlos Marighela. Preto, vermelho, verde, azul, branco e amarelo.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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