Por Jaguar
É macho ou fêmea? Segundo o guia Rio Botequim, editado pela Prefeitura, é a Paulistinha, homenagem à mulher do primeiro dono do estabelecimento, fundado em 1938. Eu, que frequento O Paulistinha há anos, posso estar errado, mas a essa altura não dá mais para mudar. A meu favor invoco o nome do agito pré-carnavalesco que movimentou o lugar durante 18 anos, O Berro do Paulistinha. O último Berro foi em 88.
Zinho e o saudoso Manola bancavam a festança em grande estilo. No dia do Berro fechavam o quarteirão da Gomes Freire entre as ruas da Constituição e Visconde de Rio Branco. A folia era a céu aberto e virou um marco na história do Rio. Vinham bichas internacionais, de Paris, Buenos Aires e o escambau. O primeiro andar do Hotel Primor, em frente ao bar, era reservado para os convidados, as janelas viravam camarotes onde rolava scotch de 12 anos e a melhor champagne francesa. A mordomia era total: em cada uma das 400 mesas espalhadas pela rua – dentro do bar só cabem cinco – com vista para a passarela de 65 metros os convidados ganhavam um isopor com salgadinhos e uma garrafa de uísque. Para o povão, arquibancadas para assistir ao desfile e chope servido generosamente em mangueiras.
Rogéria e Jane de Castro se revezavam apresentando as candidatas ao prêmio – pago em grana viva – de travesti mais bonito da noite. No júri, ilustres figuras do Rio de Janeiro como Justino Martins, diretor da Manchete, a deslumbrante Marina Montini, musa inspiradora de Di Cavalcanti, Eliana Pitman, Emilinha Borba, e grandes sambistas como Martinho da Vila e João Nogueira. Até o prefeito Marcos Tamoio prestigiava o Berro, que revelou, entre outras, Isabelita dos Patins e Roberta Close.
Morei uns tempos num hotel na Gomes Freire e ia lá quase todo dia tomar umas e outras com o Zinho. Às sextas-feiras ele oferecia para os amigos um inesquecível arroz com mexilhões e frutos do mar ou panelada de siris.
Longos papos que adentravam a madrugada com Waldinar Ranulpho – o Meu Sinhô – que sabia tudo de samba, e Timbira, cupincha e fiel escudeiro de Noel Rosa. Tremendo boêmio, às vezes esquecia a perna artificial no táxi, mas os motoristas sempre devolviam no dia seguinte.
Hoje não tem mais Berro, Waldinar e Timbira. Mudei-me, o boteco ficou, pra mim, fora de mão, e agora esbarro com o Zinho em outras paragens, no Chopp Gol, na Vila.
Mas o chope continua confiável. O bolinho de bacalhau e a pescadinha também podem ser pedidos sem problemas. Pra não falar da “sacanagem”, invenção da casa, espetinho com provolone, tomate, cebola, salaminho e pimentão, um clássico em matéria de tira-gosto. Já tentei fazer em casa mas não ficou legal; sem aquele chope e a conversa de botequim o sabor não é o mesmo.
Paulistinha. Av. Gomes Freire, 27. Centro. Tel. 242-2192. De segunda a sexta, das 8 da manhã à meia-noite.