Impulsionada por um grupo de entusiastas a partir dos anos 20, a transmissão radiofônica, o broadcasting, unia o país com a mesma força das atuais networks de televisão e internet.
Não eram poucos os empresários que acreditaram e investiram na primeira infância do rádio e foram bem recompensados, como Roquete Pinto, Antenor Mayrink Veiga, Henrique Morize, Renato Araújo, Ademar Casé, os irmãos Manes e Arnaldo Moreira Pinto, este dono da Rádio Clube Pernambuco (PRA-8), mais tarde vendida a Assis Chateaubriand.
Era de tal forma importante o rádio no Brasil que quando morreu Moreira Pinto houve tamanha comoção no Estado que seu enterro teve pompas de féretro federal, e tantos eram os candidatos a orador de beira de cova que as famílias e os amigos, para evitar tumulto, decidiram que só discursariam três pessoas: um deputado, representando o povo, Tavares Maciel, funcionário da casa, e Agamenon Magalhães, governador de Pernambuco.
Acontece que entre os mais profundamente feridos com a morte do chefe estava Chico Holanda, espécie de factotúm da Rádio Clube, de quem diziam ser fundador da Pitubrás, em razão do seu apego à garrafa e ainda mais naquela hora de dor, quando o desconsolo se abateu sobre ele com o falecimento de Moreira Pinto. Tão logo o governador encerrou sua fala e sem que pudessem impedi-lo, Chico Holanda voou para perto do caixão e, desatado em pranto, desatou sua despedida.
– Arnaldo – soluçava alto – você foi meu pai, minha mãe, meu irmão.
E enveredou por uma lista interminável de parentescos e contraparentescos metafóricos, que acabou arrematando com grandiloquência operística, braços erguidos:
– Você, Arnaldo, foi minha VIDA!
Como o Chico abriu demais a boca para berrar a última palavra, voou-lhe a dentadura, que caiu dentro do caixão, sumindo por entre as flores.
Diante do imprevisto, o orador continuou a arenga enquanto tateava o defunto à cata da cremalheira. E foi se alongando, alongando, já se ciciava de aflição e cutucavam o Chico, que prosseguia na busca vã e no palavrório torrencial.
Num dado momento, querendo terminar o martírio do morto e dos vivos, um amigo da família, Aldemar Paiva, agarrou o Demóstenes sertanejo e o foi arrastando para longe do caixão.
Chico Holanda, em desespero, vendo baixarem a urna funerária, assinou a oração fúnebre com a seguinte frase, proferida com voz enforcada e boca murcha:
– Vai, Arnaldo! Vai e leva meu último sorriso!