O discurso semântico do ex-governador Jânio Quadros – a substância de sua fala – ganhava mais força pelo impacto causado pelo discurso estético, a impressão provocada por sua maneira de falar, os olhos esbugalhados, os cabelos compridos e revoltos, a barba por fazer, um jeito desleixado que confundia interlocutores e assistentes: aquilo seria natural, coisa do acaso, ou algo preparado, artificializado?
Em Jânio, essa ambiguidade tornou-se marca de sua personalidade. Ficaram famosas suas campanhas em São Paulo, desde os tempos de vereador, quando escolheu o bairro de Vila Maria para montar o primeiro palanque de sua trajetória. Ombros cheios de caspa, sanduíches de mortadela, pão com banana, tudo sob as vistas dos fotógrafos, eram um prato saboroso para a mídia. Mas era tudo previamente ensaiado.
Um exemplo desse artificialismo consciente ocorreu durante a campanha pela Prefeitura de São Paulo de 1985, contra Fernando Henrique Cardoso, o senador sociólogo da época. Jânio foi ao bairro de São Miguel Paulista, na Zona Leste, reduto de nordestinos.
Depois de uma farta feijoada e inúmeras caipirinhas, Jânio não resistiu e caiu na cama. Atrasado, às 18 horas levantou-se, vestiu o terno amarfanhado e colocou uma banana no bolso. Ao começar o discurso, foi logo dizendo:
– Político brasileiro não se dá ao respeito. Eu não. Desde as 7 horas da manhã que estou caminhando por este bairro e até agora não comi nada. Então, com licença.
Sob os aplausos da massa, devorou a banana.