Causos Políticos

Tabira Ferreira e a honra de Juruá

Tabira Ferreira, o eterno prefeito de Juruá
Postado por Simão Pessoa

Na época em que os bichos falavam (“e aí, bicho, tudo bem?”), o seringal do Caitaú fazia parte da comarca de Carauari. Ninguém sabe explicar o significado do nome, mas dizem que sua origem é indígena.

O seringal do Caitaú deu origem a uma vila, que depois virou uma pequena cidade, que depois virou a capital do município de Juruá, quando este foi desmembrado de Carauari no final dos anos 70, durante o governo de José Lindoso.

O pessoal de Carauari, que detestou ter perdido parte de seu território, continuou se referindo pejorativamente ao novo município como Caitaú, para desespero dos juruaenses.

Recém-eleito prefeito do município, Tabira Ferreira, irmão do eterno subsecretário municipal de Obras de Manaus, o ubíquo Tabajara Ferreira, tomou posse no seu primeiro mandato (hoje ele está no terceiro ou quarto, sei lá) em meio a uma encrenca federal: como o prefeito anterior não recolhia para os cofres públicos as receitas provenientes das contas pagas para a Telamazon, a companhia telefônica simplesmente parou de operar na cidade.

A cidade de Juruá ficou isolada.

Para minorar o sofrimento da população, Tabira comprou um possante radiotransmissor-receptor, faixa cidadão, que instalou no seu gabinete, e as comunicações passaram a ser feitas por meio das ondas hertzianas.

Diariamente, centenas de moradores faziam fila na sede da prefeitura para mandar recados e notícias para seus parentes.

Determinada manhã, enquanto Tabira despachava com seu secretariado, o rádio quebrou a monotonia da reunião com um apelo desesperado:

– Caitaú, Caitaú, Caitaú, Carauari chamando urgente. Câmbio!

Tabira nem se dignou a olhar para o aparelho.

Cinco minutos depois, recomeçou a ladainha.

– Caitaú, Caitaú, Caitaú, Carauari chamando urgente. Câmbio. Responda se estiver na frequência, Caitaú. Câmbio. Carauari chamando urgente. Câmbio.

O prefeito continuou despachando normalmente, como se o apelo não lhe dissesse respeito. E o locutor do município vizinho na mesma ladainha.

Lá pelas quatro horas da tarde, provavelmente cansado de bater na mesma tecla, o locutor de Carauari resolveu mudar de tática:

– Juruá, Juruá, Juruá, Carauari chamando urgente. Câmbio.

Tabira deu um salto sobre o microfone, abriu a frequência e mandou bala:

– Custou, mas aprendeu o nome do município, né, filho da puta?… Fala o que tu tá querendo dizer, desgraça! Juruá na escuta. Câmbio.

Nunca mais chamaram Juruá de Caitaú.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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