Boemia

Butiquim do Martinho

Postado por Simão Pessoa

Por Jaguar

Pra quem já enfrentou – e superou – tantos desafios, acho muito natural que Martinho José Ferreira, Comendador da Ordem do Rio Branco, grau de Oficial, conhecido em Vila Isabel, Duas Barras, Angola e no resto do mundo, inclusive na Bahia, como Martinho da Vila, seja autor de uma façanha aparentemente impossível: abrir um boteco carioca pra malandro nenhum botar defeito, dentro de um shopping.

Só vendo – e bebendo – pra crer. Parece um lance de filme de ficção científica: a gente sai do corredor de um shopping cheio de lojas sofisticadas, igual a qualquer shopping do mundo – nesta merda de globalização todos se parecem, seja em Paris, Londres ou Caracas – e entra em outra dimensão, um boteco onde Nelson Cavaquinho e o próprio Noel, padroeiro de Vila Isabel, se sentiriam em casa, ou melhor, no bar da esquina.

As mesinhas são de tampo de mármore, é claro. Pra quem gosta de cultivar calo no cotovelo e paquerar com maior campo de visão, tem um acolhedor balcão de madeira, como deve ser. Nas paredes – de azulejo, como nos botequins que se prezam – fotos de grandes sambistas e um mural com a igreja de Santo Antônio, no alto do morro. O fato do santo não estar com cirrose – todos dão dízimo da sua cachaça – só pode ser mais um milagre.

O chope vem tinindo e os petiscos, além dos tradicionais, têm como destaques o pastel de queijo com camarão, o bolinho de carne-seca y otras cositas. Para quem quer algo de mais sustância, a rabada, que chega à mesa com todos os adereços, quebra um galhão. Sem falar na carne-seca desfiada e o irresistível batuque na cozinha (caldinho de feijão com torresmo); desse, garanto, contrariando a letra do samba de Martinho, Sinhá vai gostar.

Mas, por mais apetitosos que sejam os comes e bebes, o melhor que a casa oferece é, como não podia deixar de ser, a roda de samba. A partir de terça, a partir das 19:30, quer dizer, mais ou menos, né? Porque se trata de uma roda de samba carioca e não suíça.

A coisa rola sabe-se lá até que horas e a fina flor do samba comparece para assinar o ponto: Beth Carvalho, a madrinha-mor do samba, Noca, Luiz Carlos, que é também da Vila, Nelson Sargento, Walter Alfaiate, a rapaziada e, evidentemente, o dono da casa.

Numa entrevista que fiz com ele perguntei qual era a sua função no Butiquim do Martinho. Resposta: “Nenhuma. Só beber. Minha mulher é quem cuida do negócio.”

Butiquim do Marinho. Rua Barão de São Francisco, 236. Vila Isabel, Shopping Iguatemi. Tel. 577-7160. Todos os dias, das 10 da manhã à 1h30 da madrugada.

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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