Club dos Terríveis

Uma carta portuguesa, com certeza

Alegoria da fundação da Real Casa Pia de Lisboa
Postado por Simão Pessoa

Por Marcos Vasconcellos

O senhor Diogo Inácio de Pina Manique foi cidadão de alta importância nos arredores dos séculos 18 e 19. Nasceu o gajo em 1733 e finou-se em 1805, em Portugal, naturalmente.

Formou-se pela Universidade de Coimbra e, sob o manto real de D. Maria I (ela mesma, a louca, a que mandou atear fogo aos teares mineiros), ocupou cargos de relevância.

Eis alguns deles: juiz do crime nos bairros do Castelo (1758) e Alfama (1765), desembargador da Relação e Casa do Porto (1768), desembargador dos Agravos da Casa de Suplicação (1771), fiscal da Junta da Administração da Companhia de Paraíba e Pernambuco (1774), superintendente-geral dos Contrabandos e Descaminhos dos Reais Direitos (1775), contador da Fazenda (1776), desembargador do Paço (1786), administrador-geral da Alfândega do Açúcar, provedor dos feitos das alfândegas do Reino (1781) e chanceler-mor Reino (1803).

A Real Casa Pia de Lisboa também foi fundada por Pina Manique, em 1780, e começou a funcionar no Castelo de São Jorge, em Lisboa, sendo inicialmente destinada a recolher ladrões, prostitutas, proxenetas, mendigos e todos aqueles que “denegriam a sociedade lisboeta” de então. Esta instituição destinava-se à educação de órfãos e à recuperação de mendigos e vadios através do trabalho.

Em linhas gerais, Pina Manique era uma espécie de Almirante Pena Botto melhorado (ou piorado), vale dizer, homem de extremíssima direita e reacionário ensandecido.

Aplicado misoneísta, tinha aversão a tudo que fosse novo – ideias, costumes, artes, etc.

Contudo, suspeito que deveria ter sido um sujeito engraçadíssimo, a julgar pela carta que minha amiga Lúcia Giacomini desencavou da Biblioteca de Lisboa.

Pina Manique endereçou a carta ao Duque de Cadaval, Corregedor-Mor da Justiça do Reino de Portugal quando ele, Pina Manique, era Corregedor de Justiça de Santarém.

Eis a carta, na íntegra:

Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Cadaval:

Se o meu nascimento me põe em circunstância de Vossa Excelência me tratar por tu, caguei em mim.

Se o honroso cargo que exerço, de Corregedor da Justiça de Santarém, permite Vossa Excelência me tratar por tu, caguei para o cargo.

Mas, se nem uma nem outra coisa consente semelhante linguagem, caguei para o tratamento.

Rogo a Vossa Excelência que me informe acerca dessas particularidades, para saber ao certo se devo, então, cagar para Vossa Excelência.

Atenciosamente,

(a) Pina Manique

Santarém, Portugal, em 23 de maio de 1793

Sobre o Autor

Simão Pessoa

nasceu em Manaus no dia 10 de maio de 1956, filho de Simão Monteiro Pessoa e Celeste da Silva Pessoa.
É Engenheiro Eletrônico formado pela UTAM (1977), com pós-graduação em Administração pela FGV-SP (1989).
Poeta, compositor e cronista.
Foi fundador e presidente do Sindicato de Escritores do Amazonas e do Coletivo Gens da Selva.

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